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Opinião
03/03/2009 - 11h03
Os arrependidos
Percival Puggina - Parlata
 

Existem fatos que, de modo impiedoso, nocauteiam suas versões. O leitor certamente lembra dos dois boxeadores cubanos que desertaram durante o Pan e acabaram deportados. A respeito deles, o que mais se ouviu na versão oficial foi que “estavam arrependidos” e “pedindo para voltar”. Talvez nada retrate melhor essa lorota do que o texto de conhecido jornalista econômico, intitulado “O caso dos pugilistas cubanos” (procure por tal título na internet e divirta-se). Nessa pérola do servilismo digital afirma-se que eles haviam sido “enganados por um empresário europeu, passaram alguns dias em uma boa farra, enquanto aguardavam para fugir para a Europa (...) até que se deram conta de que os empresários eram malandros”. Em vista disso, esclarece o companheiro jornalista, ambos se “apresentaram numa delegacia” – ao que junta um competentíssimo “se não me engano” – “pedindo para voltar para Cuba”. Não, ele não se engana. A serviço da causa, como muitos outros, ele quis nos enganar a todos.

Mas o difícil, mesmo, é iludir os fatos. Meses depois, Erislandy Lara se arrependeu do arrependimento e escapou de Cuba para o México, contratado pelo mesmo empresário que tramara a fuga no Brasil. Livre e solto, como convém aos seres humanos, informou que o colega Rigondeaux, parceiro na empreitada daqui, permanecia em Havana, vivendo de biscates, proibido de lutar. Aliás, sobre isso nunca houve dúvida porque, tão logo os teve de volta, Fidel declarou ao Granma que atleta que abandona delegação é como “soldado desertor”. E lá ficou Rigondeaux, talentoso bicampeão olímpico e mundial, passando necessidades para sobreviver, curtindo remorso. Até que, agora, agorinha mesmo, na outra segunda-feira (23/02), arrependeu-se do arrependimento e evadiu-se para Miami, onde permanece, livre e solto como até às pombas convém. Exatamente como estava quando seu sonho foi truncado pela intervenção das nossas autoridades.

Deus, como os fatos são reacionários! A fuga do segundo boxeador joga na lona, com olho roxo, a versão brasileira. Por que não tiveram para com os rapazes uma fração do respeito que devotam para com seus algozes em Cuba? Foi o afeto e a reverência que nossos governantes dedicam a Fidel que geraram a constrangedora seqüência de erros. O maior de todos, sem dúvida, foi o total isolamento dos atletas enquanto estiveram sob seu zelo e vigilância. Graças a isso, por vários meses, só tivemos versão e quase nenhum fato.

Mas não foi preciso contar até dez. Teimosos, os eventos se ergueram como se não soubessem com quem estavam lutando. E aprontaram esse tipo de constrangimento. A propósito, convém esclarecer: é bem provável, mesmo, que os cubanos, quando presos no Brasil, conscientes de que voltariam para a ilha-presídio, se tenham declarado “arrependidos”. Esse arrependimento, formal, faz parte da liturgia comunista desde os tempos de Stalin. É algo que não se passa no plano da consciência, mas um pouco mais abaixo, ali onde o medo se manifesta. A primeira exigência que incide sobre quem cai em desgraça é esse “arrependimento”. Depois sobrevêm, impiedosas, as punições. Stalin esperava o arrependimento público, cobrava a delação de todos os dissidentes falsos ou reais, aguardava o pedido de compaixão e só então mandava matar. Coisa de alguns milhões, apenas.

O médico cubano Oscar Elias Biscet, por outro lado, resolveu lutar com os fatos. Começou a fazer discursos contra o aborto, no hospital onde trabalhava, e agora cumpre pena de 25 anos de prisão. Mas para o humanista e solidário governo brasileiro, claro, isso não quer dizer coisa alguma. Imprestável, mesmo, é a justiça italiana.


Nota do Editor: Percival Puggina (www.puggina.org) é arquiteto e da Presidente Fundação Tarso Dutra de Estudos Políticos e Administração Pública. Conferencista muito solicitado, profere dezenas de palestras por ano em todo o país sobre temas sociais, políticos e religiosos. Escreve semanalmente artigos de opinião para mais de uma centena de jornais do Rio Grande do Sul.

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