Vez ou outra, policiais, inclusive de alta patente ou graduação, são surpreendidos praticando irregularidades, até crimes. Isso ocorre porque são seres humanos, portadores de emoções, distúrbios físicos, emocionais e comportamentais e, portanto, sujeitos a todas as virtudes e fraquezas da espécie. Tais deficiências podem ser manifestas ou potencializadas dentro do estresse e do meio profissional adverso em que atuam. O bom de tudo é que as corporações policiais não admitem os desvios e os errantes não ficam impunes. As corregedorias e ouvidorias que apuram corrupção, excessos ou delitos, são efetivamente independentes e desconhecem postos, cargos ou patentes, colocando suas vistas apenas sobre o ato cometido. Como resultado, coronéis, tenentes-coronéis, majores, capitães, tenentes, praças, delegados e policiais de todos os níveis, quando reconhecidamente faltosos, acabam sumariamente presos, processados e exonerados. As polícias paulistas e as da maioria dos Estados brasileiros são inflexíveis quando tratam de faltas cometidas por seus integrantes. Isso tem garantido o cumprimento das funções constitucionais, o respeito e a confiança da sociedade, apesar de todos os problemas identificados. Interna corporis, tudo funciona séria e honestamente. Assim, a sociedade ainda dispõe de uma relativa segurança. Quem tiver a disposição de analisar as polícias - civis ou militares -, para ser mais preciso, tem de separar a atuação das próprias corporações e a dos governos a que servem. Embora façam parte da máquina governamental e tenham seus dirigentes máximos nomeados pelos governantes, as polícias são instituições compostas por um funcionalismo concursado e de carreira, que conhece muito bem as suas atribuições. Se não chegam a cumpri-las integralmente, é por deficiência de recursos e estrutura. Qualquer cidadão sabe que as polícias seguem normas próprias, mas não contam com todos os recursos materiais que o Estado é legalmente encarregado de prover. Governos demagógicos compram viaturas, coletes, armamento e outras quinquilharias que podem mostrar, mas não pagam salários adequados. Por conta dessa política perversa, vigente há mais de uma década, surgiu o "bico". Como o soldo pago não atende às necessidades da classe, a própria instituição, em conseqüência, é levada pelo descaso do governo, a fazer vistas grossas para a questão do bico que, pelo alto risco de contaminação de seus integrantes é proibido por lei, mas infelizmente praticado por policiais de todos os níveis. Em alguns estados, eles montam até as criminosas "milícias". A instituição policial é rigorosa em seus procedimentos e pune implacavelmente os desvios de seus membros. Mas os governos têm sido negligentes e enganadores, quando criam abonos e outros artifícios para não pagar salários dignos e adequados. Felizmente ainda temos as corporações atuando dentro dos padrões de moralidade administrativa. Mas tudo isso não é suficiente, pois pune-se os faltosos mas não se corrige as falhas. É o mesmo que "enxugar gelo". Precisamos agora conseguir que, para evitar o caos, os governos façam sua parte. Nem que, para isso, seja necessário uma grande mobilização nacional... Nota do Editor: Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo e dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo).
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