A Paixão de Cristo sempre causa um sentimento de justa indignação aos que a relembram. Como puderam condenar à morte alguém que pregava a paz e a igualdade entre os seres humanos? Pensando bem, fazia sentido naquele contexto: Os romanos podiam confrontar qualquer exército de seu tempo, mas não tinham como lidar com idéias tão “subversivas” como as pregadas por Jesus. Acostumados a liderar com o respaldo de miríades de regras seculares, os doutores da lei também temiam que o livre-arbítrio pregado por aquela doutrina ameaçasse seu poder. Assim, Cristo era, de fato, muito perigoso, pois, se a força da violência física e psicológica submetia corpos, suas idéias libertavam espíritos. Sua mensagem foi e é tão transformadora, que milhares de cristãos foram perseguidos e massacrados, até que o cristianismo se tornasse a religião oficial do Império Romano e se espalhasse pelo mundo ocidental. A partir daí, e por vários séculos, os perseguidos passaram a ser outros... Os cristãos que fizeram isso foram diferentes dos que gritaram: “Crucifiquem-no!”? Mas Jesus conhecia seu destino: quem o trairia; quem o negaria... Afinal, ele era a consumação de profecias do Antigo Testamento. As portas do céu estavam fechadas e só ele poderia reabri-las! Mesmo assim, é impossível não ficar chocado com a forma como ele foi tratado: coroaram-no com espinhos; humilharam-no de todas as formas; fixaram-no com cravos na cruz; feriram seu lado com uma lança; e quando pediu água, deram-lhe vinagre... E ele aceitou tudo isso, sem nada objetar! Ele que, tempos antes, impedira que, por tradição, apedrejassem uma mulher, apenas apelando pela consciência dos que a queriam agredir: “Aquele que não tiver pecado, atire a primeira pedra”. Todos tinham pecados! Em diferentes escalas, mas tinham. Apesar de todo aquele sofrimento, Cristo, em seus derradeiros suspiros, ainda perdoou seus algozes e toda humanidade, para depois entregar-se aos braços de Deus. Perdão e vida! Que grande lição ele nos ensinou! Lição que é repetida nas celebrações dos cristãos. Mas será que a humanidade realmente a aprendeu? Cristo pregou a igualdade entre os seres humanos... Então porque tantos insistem em realçar ou estabelecer diferenças? Quantos já não foram humilhados e levados à morte por pensamentos, atos e palavras de gananciosos que se dizem cristãos? Quantos já se mataram em guerras foram feitas em nome do mesmo Deus? Mas não é preciso ir tão longe, para encontrar outras contradições: Fora e até dentro de seus templos existem “cristãos” que discriminam mesmo aqueles que chamam de “irmãos”, por sua origem, condição social, raça ou simplesmente por não pertencerem à mesma religião. O discurso é belíssimo, recheado de citações bíblicas! Mas a prática... Quase sempre, o que se vê são aparências e o desejo de ascendência sobre o semelhante. Ser “mais igual”... Será que as “pedras” que lançamos ou colocamos no caminho do próximo não são as mesmas não atiradas pelos que ouviram aquele apelo de Cristo ao bom senso? Será que não o estamos traindo e negando ao impor aquilo que ele facultou à consciência de cada um? Será que isso não é como se a marreta que pregou os cravos na cruz, ou a lança que feriu o lado de Jesus estivessem em nossas mãos? A lembrança da Paixão motiva à reflexão. A celebração da Páscoa é a própria celebração da vida! Reflexão e celebração da vida: todo dia é dia! Então, paremos de atirar pedras, de crucificar, de ferir, de humilhar, de pré-julgar! Crer na vida! Crer no amor! Crer na paz! Viver sem medo! Viver em plenitude! Ressuscitar em vida e transformar o mundo! Feliz Páscoa! Nota do Editor: Adilson Luiz Gonçalves é mestre em educação, escritor, engenheiro, professor universitário (UNISANTOS e UNISANTA) e compositor. E-mail: prof_adilson_luiz@yahoo.com.br.
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