O valor do tempo depende da intensidade com que cada um de nós vive cada momento de amor, de paixão, de sonho e até de raiva. Se somos muito intensos, o tempo parece passar mais depressa. Um fim de semana com um grande amor parece que só teve algumas horas, enquanto um sábado apenas, num lugar aborrecido e com pessoas desagradáveis parece durar um mês inteiro. E uma hora num engarrafamento de trânsito? Nossa, temos a impressão de que ficamos lá, parados, duas, três horas... São Paulo é a cidade onde o tempo é mais duramente desperdiçado, em filas de bancos ou de cinemas, de teatros e até do cafezinho. Um cafezinho aromático, saboroso, quente e forte – e temos cafés incríveis, aqui – pode nos custar cinco minutos na fila do caixa e outros cinco para conseguir a bebida, no balcão. Digamos, porém, que ele vale a pena... Enfrentamos filas até para fazer compras... ah! As filas dos caixas das grandes lojas... e dos supermercados... Somos muito simpáticos! Sim, porque não reclamamos das filas, dos congestionamentos, da alucinação nossa de cada dia... E quando esquecemos e passamos pela porta de um colégio na hora da saída? É aquele fuzuê... mãe pra lá, aluno pra cá, nem o santo que dá nome à cidade conseguiu resolver isso... Os paulistanos gritam? Que nada! Todo mundo espera caladinho, cada um no seu carro, sem buzinar nem nada... Isso é uma crítica ou um elogio? Nem um nem outro. É uma declaração de amor à cidade. Porque ela compensa, ah! Como ela compensa em outros pontos! São Paulo tem o melhor serviço do mundo: os garçons são educados e gentis e ainda carregam aquele jeitinho brasileiro de conversar com o cliente... e a comida é cinco estrelas. Mesmo num lugar pequeno e econômico, o bife pode ser dos deuses, veja o Sujinho da Rua da Consolação. Os taxistas são conversadores e não dão voltas inúteis com os passageiros. O pessoal das lojas trata cada freguesa como a rainha da Inglaterra... nos supermercados de qualidade, podemos trocar as mercadorias até mil vezes, eles vão trocando, sempre com um sorriso nos lábios. Até os porteiros dos prédios (meio apavorados pelos últimos arrastões) tentam parecer o mais tranqüilos possível... E os motoristas, muitas vezes agressivos no trânsito normal, quando vêem, pelo retrovisor, uma ambulância? Sobem até na calçada para que ela passe. Ainda há gentileza em São Paulo. Ainda há um sorriso, quando precisamos dele. Ainda há alguém nos ajudando a atravessar a rua se temos (como é o meu caso) mais de 50 anos... Se tempo é dinheiro, estamos pagando um alto preço para jogar tempo fora aqui. Mas que esta cidade valeria muito mais do que pagamos, eu não tenho dúvidas. Fervilhante, fascinante, tão rica em seus contrastes de luzes e sombras, tão atraente em seus contrastes de tristezas e alegrias tão senhora de si em seus contrastes de cinzas e verdes, tão surpreendente em seus bairros da pesada ou rigidamente familiares... São Paulo, que perdeu sua garoa para o aquecimento da terra, que ganhou as melhores sorveterias do mundo por causa dos limites dos trópicos que avançam sobre a cidade. São Paulo que perdeu a maioria dos seus ônibus elétricos (zero poluição) para governantes áridos, mas que começa a plantar 300 coqueiros na Rua Augusta, por onde antes eles deslizavam, silenciosos... São Paulo, que pode ter perdido seu romance, mas guarda a paixão. São Paulo, com sua imensa capacidade de dar o melhor a cada um dos brasileiros e estrangeiros que nela dormem, acordam, trabalham e se distraem, ou seja, vivem, de verdade. São Paulo, fervilhante de amor, generosa, doce e eterna! Que a solidariedade seja sua marca, para sempre, amem! Nota do Editor: Laís de Castro é jornalista desde os 21 anos, quando estreou na tradicional revista Realidade, trabalhou 18 anos na Editora Abril, vários anos na Carta Editorial e outros mais na Azul. Ganhou 3 prêmios Abril, um concurso de contos infantis no Estado do Paraná e é autora do livro de histórias para adultos: “Um Velho Almirante e outros contos”, publicado pelo selo ARX (Siciliano). Atualmente dedica-se apenas à Literatura.
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