Outro dia, durante uma visita técnica a uma obra, um dos alunos alertou que vira um operário utilizando um martelete hidráulico (vulgo, britadeira) sem os EPI (equipamentos de proteção individual) recomendados (capacete, óculos de segurança etc.). Ao tirar uma foto da atividade, o operário, com cara de poucos amigos, teria dito que isso não era permitido. O aluno afirmou que alguém deveria obrigar o funcionário a utilizar os EPIs necessários, mas mostrou-se ainda mais inconformado com o fato do próprio indivíduo não utilizá-los, sabendo que corria riscos. A obra dispunha de sinalização de advertência adequada e os EPI estavam lá. Provavelmente, dispunha de técnico de segurança. Mas, pelo jeito, bastava virar as costas para que alguém burlasse as regras, sem medir as consequências de seus atos para si, para os colegas e para a própria família. A indignação do aluno ecoou em seus colegas. Também concordei. Aquilo era mais do que uma questão de lei ou regra: era de bom senso. Mas de que adianta todos concordarem e haverem leis e regras a granel, se quem deveria cumpri-las não o faz? Aquele pareceu um momento propício para ponderar sobre bom senso. Perguntei quem usava cinto de segurança, quando dirigia... Unanimidade inteligente! Aí, questionei quem usava o cinto, quando estava no banco de trás... Sorrisos amarelos... Lembrei que, ali, éramos todos indivíduos teoricamente esclarecidos. Perguntei, então, como pessoas desse mesmo nível se comportavam perante outras situações, para as quais também havia leis e regras. Quantas vezes eles já haviam visto alguém fumar de costas para uma placa onde se lia claramente: “Proibido fumar”? A lei federal n° 9.294/1996 estabelece: “Art. 2º. É proibido o uso de cigarros, cigarrilhas, charutos, cachimbos ou de qualquer outro produto fumígero, derivado ou não do tabaco, em recinto coletivo, privado ou público, salvo em área destinada exclusivamente a esse fim, devidamente isolada e com arejamento conveniente”. Parece claro, não? Mas alguém achou que “recinto coletivo, privado ou público” não era suficiente, e resolveu dar alguma ênfase: “§ 1º Incluem-se nas disposições deste artigo as repartições públicas, os hospitais e postos de saúde, as salas de aula, as bibliotecas, os recintos de trabalho coletivo e as salas de teatro e cinema”. Pronto! Isso deu a desculpa para os interessados dizerem que só esses ambientes tinham restrição. Restaurantes, por exemplo, não estariam incluídos. Interpretação conveniente... Alguns estabelecimentos, fechados e com ar condicionado, chegaram ao cúmulo de colocar essa legislação afixada em sua entrada para justificar a existência de área de fumantes e não-fumantes. Até aí, tudo bem, pois a lei prescreve: “salvo em área destinada exclusivamente a esse fim, devidamente isolada e com arejamento conveniente”. Só que as áreas não são “isoladas” e o “arejamento conveniente” é a fumaça espalhar-se pela área de não-fumantes. Essa mesma lei também sugere: “evite fumar na presença de crianças”. Pergunto: Precisaria de lei para isso? Isso não é uma questão de puro bom senso? Ou seja, o não uso de EPI pelos operários e o fumar em locais públicos, não é apenas uma questão de lei. Por mais ou menos “estudado” que o indivíduo seja, certas coisas dependem muito mais da cultura e da educação das pessoas, do que de leis. O limite do direito de um está no dos outros. O silêncio de quem não fuma faz o fumante crer que não há problema em desrespeitar a lei ou contrariar o bom senso. O dono do restaurante acha que perderá o cliente fumante - que não consegue ficar uma hora sem fumar, mas não fuma enquanto come - se proibir o fumo em seu estabelecimento. Ele procurará outro local. E se a maioria dos restaurantes proibisse o fumo? Teoricamente, os que toleram o vício ficariam lotados! Sucesso! Lucro para eles! Mas, e as filas de espera? Talvez os fumantes voltassem a frequentar os demais para fazer aquilo que a maioria vai fazer nos restaurantes: sentir o aroma e saborear a comida! Agora, o Estado de São Paulo cria uma lei anti-fumo ainda mais abrangente... A multa será para o estabelecimento! Os bares e restaurantes vão cumprir? Talvez abram uma janela, para dizerem que o ambiente é “aberto”. Aí, se os não-fumantes ficarem quietos, nada vai mudar. Que tal chamar o gerente e dizer: “Existem leis e cabe a vocês cumprirem-nas! Se não for assim, eu vou embora!”. O gerente vai chamar a polícia para quem? Atitudes radicais contra desrespeito e conivência contumazes: será essa a solução? É certo que de nada adianta criar leis se elas não forem cumpridas! Mas o ideal seria que o bom senso, a boa educação e o respeito ao próximo prevalecessem. Afinal, somos, em tese, seres racionais! Nota do Editor: Adilson Luiz Gonçalves é mestre em educação, escritor, engenheiro, professor universitário (UNISANTOS e UNISANTA) e compositor. E-mail: prof_adilson_luiz@yahoo.com.br.
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