Um seminário organizado no início da semana passada em São Paulo pela revista Exame reuniu três ganhadores do Nobel de Economia; Joseph Stiglitz (2001), da Universidade de Columbia, o mais keynesiano deles, Robert Mundell (1999), também de Columbia, mas que iniciou sua vida acadêmica na Universidade de Chicago, o mais criativo; e Edward Prescott (2004), da Universidade do Arizona e, com certeza, o mais técnico da competente trinca. Ganhar o Nobel, como todos sabem, não é fácil, embora a Academia Sueca frequentemente baseie as suas escolhas – especialmente na área de Ciências Humanas – por critérios políticos e não por avaliações estritamente científicas. E convidar um Nobel para qualquer evento sai bem caro, algo entre US$ 20 mil a US$ 30 mil por palestra – sem contar as despesas com bilhetes aéreos (em geral na primeira classe ou na classe executiva) e gastos com hospedagem em hotéis caros, alimentação e táxis. Mas, apesar de cobrarem bem (o que é justo, diga-se de passagem), segundo um especialista em organizar esse tipo de seminários, os palestrantes não costumam preparar apresentações específicas para cada evento (o que, a rigor, não é eticamente correto), preferindo uma “apresentação padrão” de acordo com a conjuntura do momento, que adaptam para cada local e público. No evento realizado na capital paulista, os três economistas – brilhantes, obviamente – disseram o que qualquer profissional com bom treinamento sabe, ou seja, que a crise mundial ainda não acabou e que ainda não se pode dizer quando terá fim. Ou seja, disseram o óbvio – aquele que ululava, segundo Nelson Rodrigues... Mas, no que se refere ao Brasil, a trinca de ases escorregou feio, quando não economizou elogios à política macro-econômica brasileira, especialmente a “disciplina fiscal”. Mas que disciplina fiscal é essa?! Vê-se que nenhum dos três atentou para a orgia que o governo Lula vem promovendo nos gastos de custeio e no aparelhamento da máquina estatal, nem tampouco para a miríade de gastos supérfluos do Judiciário e do Legislativo, fatos que acarretarão sérios problemas de financiamento em futuro não distante. Mas... como isto escapou às análises dos três craques da Economia? Bem, tenho duas explicações: a primeira é por educação, sim, por simples educação. Afinal, se convidarem você, leitor, para dar uma palestra no país X, é natural que você julgue deselegante criticar o governo do país anfitrião e que lhe dispensa tratamento de rei. É uma atitude errada, mas até compreensível. É da própria condição humana. Mas a segunda é por uma deformação estrutural na formação dos economistas no mundo inteiro, da qual nem os laureados com o Nobel escapam: com efeito, poucos são os que se preocupam com a qualidade dos números, porque seu treinamento os leva a olhar exclusivamente para o aspecto da quantidade. Quantitativamente, o governo Lula, especialmente na era de Palocci, fez um esforço louvável na área fiscal. Mas, no que se refere à qualidade do ajuste, ele foi lamentável e está piorando: o que se observa é o oposto do que deveria ser a meta do governo – ou seja, aumentos de arrecadação pela elevação da carga tributária e, em termos de cortes de gastos, “neca de pitibiriba”, como dizia um velho amigo. Quando cortam, fazem-no em gastos essenciais, como os com a infra-estrutura, por exemplo. Definitivamente, os elogios rasgados dos três tenores da Economia à nossa desastrada política fiscal são uma prova incontestável de que o ensino da Ciência Econômica precisa mudar, tornando-se mais humano, sem prejuízo da técnica. Os economistas precisam voltar a estudar a Escola Austríaca, como acontecia até os anos 30! A Economia é uma ciência humana, da ação humana, mexe com a vida de todos e, portanto, não pode ser tratada de forma exclusivamente quantitativa. Nota do Editor: Ubiratan Iorio (www.ubirataniorio.org) é economista, professor e presidente executivo do Centro Interdisciplinar de Ética e Economia Personalista (CIEEP).
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