O golfo resume o oceano a uma vogal circular e, dessa letra inicial, o homem partiu sozinho fazia tempo já. Quando não havia mais esperança de regresso, as nuvens rápido se adensaram num toldo só prenúncios. Toda a gente, ainda sem nome nem noção de destino, acercou-se da praia, onde as ondas alvejavam a areia como papel para a primeira escrita. E a escrita, todos logo entenderam, evoluiria do litoral para o continente. Aí, do pasmo que enfuna a interjeição, ele surgiu. Ouviu-se um “oh!” de alívio com o valor de uma prece. Não trazia peixes nem pérolas, que outro tesouro convenceu aos seus: mais que ricos, estavam salvos! Em cada porto, em cada ilha, o bravo vivera uma história. Constituíra, assim, a própria saga. Ao perceber que reunira, afinal, valioso acervo, regressou. Combalido, sim, mas já com barbas de fundador. Calçaram-lhe sandálias, deram-lhe roupas novas e, em torno à fogueira inaugural, ouviram lendas, fábulas... balbucio do que logo se tornou palavra, língua. E a História tinha já a sua primeira data! Nota do Editor: Daniel Santos é jornalista carioca. Trabalhou como repórter e redator nas sucursais de "O Estado de São Paulo" e da "Folha de São Paulo", no Rio de Janeiro, além de "O Globo". Publicou "A filha imperfeita" (poesia, 1995, Editora Arte de Ler) e "Pássaros da mesma gaiola" (contos, 2002, Editora Bruxedo). Com o romance "Ma negresse", ganhou da Biblioteca Nacional uma bolsa para obras em fase de conclusão, em 2001.
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