No meio dos anos 60, meu amigo, já falecido, Manoel Lobo me convidou para conhecer uma sessão do partidão. Isso aconteceu antes do AI-5, havia a ditadura, mas esta ainda não exibira a face sádica e cruel. Nessa época fui preso na rua Maria Antonia, numa manifestação em que ninguém escapou. A polícia militar cercou a área e a polícia marítima prendeu todo mundo. Ficamos acotovelados no DOPS, 50 numa cela onde cabiam 20, o clima era de festa e heroísmo. Os policiais que nos ficharam, apesar de irônicos ficaram nisso. Eles sabiam estar lidando com gente boa, não havia confronto armado e se protestávamos era com razão. Os planos econômicos do governo militar estavam provocando recessão e desemprego, o milagre ainda não tinha começado. No partidão a coisa era chata e chata e chata, logo percebi que se fosse para agüentar dogmas, ordens e devoção absoluta, seria melhor a igreja. Pelo menos havia o espetáculo da liturgia, das mais belas criações do homem. Quem resiste ao canto gregoriano em uma catedral com a acústica perfeita? É arrepiante. Pouco depois entrei na USP, era 1968, segundo Zuenir Ventura, o ano que não acabou. Travei conhecimento com as diversas tendências da esquerda, cuja luta real era contra facções da própria esquerda. Todos falavam mal de todo mundo o tempo todo. Nessa época descobri outros interesses - mulheres - enquanto passei a duvidar dos propósitos dos meus colegas que queriam salvar o mundo, quase todos hoje muito bem de vida às custas do erário público. Aos poucos se deu o meu afastamento definitivo dessa esquerda que fala, fala, fala e pouco faz. Fiquei entusiasmado com o PT nascente, aos poucos percebi que em nada diferia do movimento estudantil, muita conversa e pouca ação. Continuo acreditando na única bandeira da esquerda que interessa carregar, a que propõe o fim da exclusão. "O poder político é o nosso meio, a felicidade social o nosso fim".
Nota do Editor: Sidney Borges é jornalista e trabalhou na Rede Globo, Rede Record, Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo (Suplemento Marinha Mercante) Revista Voar, Revista Ícaro etc. Atualmente colabora com: O Guaruçá, Correio do Litoral, Observatório da Imprensa e Caros Amigos (sites); Lojas Murray, Sidney Borges e Ubatuba Víbora (blogs).
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