Embora há muitos anos eu tenha me dedicado a desvendar os mistérios do aquém, há um que tem desafiado minha perspicácia. Por mais que tenha me empenhado, ainda não consegui decifrar esse nebuloso enigma, envolto por uma névoa da mais densa opacidade. Como não acredito em coincidências assaz reincidentes, indago-me: Qual a relação entre a fanhice ou fanhura – sei lá qual o nome adequado para aquela coisa que ocorre com o fanhos – e os membros do PT (Partido dos Trabalhadores ou Perda Total, no jargão das companhias de seguros)? Digo isto, porque Luiz Inácio é fanho, Palocci é fanho, Marta Suplicy é fanha e Vicentinho é fanho etc. Tem que haver uma explicação, pois já disse que não acredito em coincidências assaz reincidentes. Hoje em dia, graças ao progresso da ciência e da tecnologia, só continua fanho quem quiser ou não tiver dinheiro para pagar um bom fonoaudiólogo. Assim como a gagueira, a fanhura ou fanhice – popularmente conhecida como “língua presa” - tem cura. Como Palocci e Marta saíram de cena por enquanto, mas para voltar no próximo ato, não sei se estão se curando de suas respectivas fanhices nos bastidores. Mas por falar nisso, eis que Vicentinho reapareceu em cena. Vocês se lembram dele? Era aquele agente da CUT-PT - caso inédito no mundo, pois é um sindicato-partido – que esbravejava contra as desigualdades sociais nas portas das fábricas do ABC, um operário semialfabetizado, que não conseguia disfarçar sua constrangedora fanhura. Mas o tempo passou e Vicentinho melhorou. Recebeu o duplo título de “doutor”, pois se formou como bacharel de direito – não digo que passou a ser advogado, porque não sei se passou na provinha da OAB, nem sei mesmo se a fez. Mas se elegeu deputado federal em São Paulo. E como todo mundo sabe, um candidato a vereador ou deputado, uma vez eleito pelo povo, passa a ser chamado de “doutor”, mesmo que tenha segundo grau incompleto, como muitos deles. Todavia, não foi só o nível educacional de Vicentinho que melhorou. Verifiquei, com esses ouvidos que a terra há de comer, que Vicentinho não é mais fanho, embora continue no PT-CUT. Milagre? Não, árduos e cansativos exercícios de fonoaudiologia. Como já os fiz por outro motivo, conheço-os muito bem. De fato, melhorou a fala, melhorou o status educacional, só não melhoraram suas idéias que continuam mais tortas do que nunca. Digo isto após ter assistido àquele ótimo programa na TV do Joelmir Betting em que estavam presentes Vicentinho e José Pastore, veterano professor de Economia da USP e um dos mais competentes especialistas brasileiros na relação capital/trabalho. Sinceramente, encontrei-me diante de um debate em que saltava aos olhos a desigualdade intelectual, mas Vicentinho só é contra outra desigualdade: a social. Por isso mesmo, não se avexou diante de seu poderoso adversário e o enfrentou como o pequeno David em priscas eras enfrentara o gigante Golias, com a diferença de que David tinha uma funda e sabia manejá-la muito bem. O que estava em jogo era o projeto do deputado Vicentinho, que era na realidade a encarnação de uma antiga aspiração não só dos filiados da CUT-PT, mas de todos os trabalhadores do Brasil: trabalhar menos, mas não para ganhar mais nem menos: para ganhar exatamente o mesmo, porém o mesmo salário nominal, é claro. Tecnicamente a coisa se chama: Redução da jornada de trabalho para 40 horas, sem redução de salário. Beleza pura, não é mesmo? Quem não quer? Embora não tenha dito isso, certamente Vicentinho pensava que, se tal redução não tinha sido feita ainda, era por causa da mesquinhez e da ganância dos empregadores, mas ele não disse isso: alegou que, com a referida redução, os trabalhadores ficariam satisfeitos por trabalharem menos – Disto nem seus patrões duvidam! – seria gerado um número maior de empregos – O que é bastante duvidoso - e seus patrões ganhariam mais. Ora, será que eles não gostariam de ter mais lucros ou não descobriram ainda o caminho das pedras? Com a paciência de velho sábio chinês, José Pastore apresentou várias e sérias objeções ao projeto. Disse até mesmo que algumas empresas já tinham adotado a redução por conta própria, mas que ela dependia do tipo de empresa e que ele era contra o governo obrigar a todas, indistintamente, a fazer tal coisa. Disse ainda Pastore que essa idéia de redução da jornada de trabalho já tinha sido posta em prática em muitos países sem que tenha dado certo em nenhum. Como dizia Millôr Fernandes, Ph.D. em idiotices humanas com especialidade nas brasileiras: “Quando uma ideologia fica bem velhinha e carcomida ela faz as malas e vem para o Brasil” e parece que se hospeda na cabeça de algum membro do PT. Nota do Editor: Mario Guerreiro (xerxes39@gmail.com) é Doutor em Filosofia pela UFRJ. Professor Adjunto IV do Depto. de Filosofia da UFRJ. Ex-Pesquisador do CNPq. Ex-Membro do ILTC [Instituto de Lógica, Filosofia e Teoria da Ciência], da SBEC. Membro Fundador da Sociedade Brasileira de Análise Filosófica. Membro Fundador da Sociedade de Economia Personalista. Membro do Instituto Liberal do Rio de Janeiro e da Sociedade de Estudos Filosóficos e Interdisciplinares da UniverCidade. Autor de obras como Problemas de Filosofia da Linguagem (EDUFF, Niterói, 1985); O Dizível e O Indizível (Papirus, Campinas, 1989); Ética Mínima Para Homens Práticos (Instituto Liberal, Rio de Janeiro, 1995). O Problema da Ficção na Filosofia Analítica (Editora UEL, Londrina, 1999). Ceticismo ou Senso Comum? (EDIPUCRS, Porto Alegre, 1999). Deus Existe? Uma Investigação Filosófica. (Editora UEL, Londrina, 2000). Liberdade ou Igualdade (Porto Alegre, EDIOUCRS, 2002).
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