Ela foi, sem dúvida, o seu primeiro amor. Ah, mas isso fazia já décadas! E agora ali estava a mais querida, quietinha no escuro do cinema, enquanto ele tomava coragem para lhe entregar uma rosa de admirador. Não lembrava mais a moça vaporosa que lhe pegava a mão no ensino das primeiras letras, deixando escapar o hálito sedutor bem perto do seu rosto. Agora, apesar de senhora, mantinha o mimo dos traços de então. O antigo fogo moveu-o até ela, que não estranhou a presença do desconhecido nem se afastou ao sentir o roçar de seu joelho. Surpreso, mas audaz, tocou-lhe a coxa com firmeza. Receptiva, sorriu-lhe com lábios... Ah, aqueles lábios, aquele mesmo hálito! A memória instigava-o. Sem resistências, ele avançou mais e logo estavam no pequeno apartamento da professora, onde amou-a com atraso de duas décadas! Já madrugada, esgotada e adormecida, ele aproveitou para sair sem promessas, mas deixou-lhe na despedida a rosa num copo d’água. Como nos tempos de escola! – lembrou-se com carinho o eterno seduzido. Nota do Editor: Daniel Santos é jornalista carioca. Trabalhou como repórter e redator nas sucursais de "O Estado de São Paulo" e da "Folha de São Paulo", no Rio de Janeiro, além de "O Globo". Publicou "A filha imperfeita" (poesia, 1995, Editora Arte de Ler) e "Pássaros da mesma gaiola" (contos, 2002, Editora Bruxedo). Com o romance "Ma negresse", ganhou da Biblioteca Nacional uma bolsa para obras em fase de conclusão, em 2001.
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