Minha cunhada tem um grave problema: ela adora corrigir erros da gramática palatal das pessoas comuns. E isso não seria nada se ela corrigisse de forma amigável e aconselhável de modo discreto. Mas ela adora revisar e alentar os erros da língua falada em público, assim, indiscretamente. Para o corrigido é extremamente constrangedor, vejo como meu irmão fica quando erros cotidianos e até perfeitos da língua portuguesa acontecem exatamente quando ela está presente. Nós que desconstruímos as palavras para formarmos outras, contribuindo para o léxico do idioma, lidar com o pedantismo da pseuda sapienza gramatical, certas horas é uma missão quase lúdica, para não dizer anti-didática e de guerrilha intelectual inútil e barata. Prefiro que seja assim então, numa competição familiar amistosa e boba. Aniversário de família, eu já com algumas cervejas na cabeça, abusando da metalinguagem alcoólica com meus familiares, eis que numa conversa ela ouviu um erro de tempo verbal saindo de minhas entranhas mal articuladas. Era a primeira vez que ela me corrigia e eu sabia que mais cedo ou mais tarde nós iríamos conversar sobre a coerência das coisas. Nós estávamos conversando sobre futebol, ela como uma boa palmeirense disse que queria ter seis filhos, e que os seis seriam palmeirenses (nem assim aumentaria a torcida). Daí eu como um bom corintiano disse que pelo menos um tinha que se salvar. Mas eu falei “como são seis que vão vir, um teria que se salvar” e ela retrucou dizendo: - “como são seis que virão”. Ok. Não quis discutir o âmago da coisa e resolvi voltar pro assunto do futebol. Fiquei com aquilo na cabeça e resolvi que ela iria sofrer as conseqüências do seu plano constrangedor fora de hora. Tinha um plano infalível. Se ela não errasse logo tentaria persuadi-la ao erro, confundindo-a. Não demorou muito, foi justamente no dia seguinte, num domingo à tarde, jantando o resto do churrasco do dia anterior. Nem mesmo a ressaca da cervejada me tirou o prazer de deixá-la falar livremente para eu achar uma brecha para corrigi-la em sua sintaxe de uma estudante de engenharia de produção. Resumindo, ela errou o verbo ser no pretérito perfeito, o que era ficou é e ela quis debater e eu não dei trela. Ri por dentro como quem gargalha. Missão cumprida. Ela jamais entenderia Oswald de Andrade. Que pena.
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