Quando não há interesse e nem vontade, o produto do trabalho é ruim. Quando a preguiça chega, pode ser que o serviço nem fique pronto. E quando o executar caminha dessa forma, é melhor o resultado ficar escondido. Fazer por fazer ou fazer o melhor? Dados indicam que as mulheres desperdiçam 5% do material de construção, enquanto os homens jogam fora 30% de tudo para fazer a mesma tarefa. Ter uma obra de construção ou reforma é motivo para mais do que aborrecimento. A lista de mazelas da obra mal feita é interminável, mas fiquemos com algumas: sujeira, paredes tortas, restos de cimento nas superfícies, canos entupidos, estética deplorável, necessidade de desmanchar e refazer. Deu a hora – no norte de Minas o horário de trabalho nas construções é de 7 às 17 horas, pode haver massa preparada, que largam tudo e vão embora. Amanhã, o que ficou sem utilizar está imprestável. Então, é desprezar e ir ao recomeço. A minha mãe, para se referir a um serviço feito com muito capricho, dizia assim: “fez a colher de pau e bordou o cabo”. Nessa mesma linha, o multitalentos Darcy Ribeiro falava que os índios faziam os seus objetos com tanto carinho que superavam a utilidade, chegando, não raro, à arte. Muitas peças indígenas são detidamente contempladas, enquanto procuramos nelas o tamanho da paciência que envolveu a sua execução. A mais linda toalha de banquete que eu já vi, delicada e perfeita, foi produzida por chineses do sexo masculino. Custo a calcular o tempo gasto no todo em cada ponto do imenso bordado e rendas feitos a mão. Também as rendas produzidas no Ceará pelas incansáveis rendeiras, que se ocupam por meses jogando bilros até verem o fino tecido, saem da área produtora por preços irrisórios. Apenas nas lojas do sul esse trabalho é valorizado, e quem fez a peça não recebeu quase nada. Há pessoas, que para fazer suas obrigações de rotina, enfeitam o que fazem, dão tudo de si, e nem sempre para buscar elogios. Limpam a casa cantando, fazem a comida trivial com ares de banquete, “se banham com leite, se arrumam” para esperar os seus amados. Atividades banais são meticulosamente estudadas e feitas com atenção e harmonia, procurando naturalmente uma solução fora do gráfico, ou seja, acima dele, inflacionando a qualidade. É estimulante, em todos os setores, nos depararmos com resultados desse nível. A busca da empatia numa consulta médica, algumas vezes é amplamente alcançada e a conversa se faz de forma agradável para os dois lados. Há equilíbrio entre a ciência médica e o lado humanístico, e as partes se veem satisfeitas e completas. Nessa situação, o saber médico avança da técnica para a arte, mesmo que não haja a possibilidade de curar, pois algumas vezes a medicina passa longe da cura. Outras vezes, em momentos em que não há indicação de coisa boa, no meio do caos, uma criança é arrancada da morte em meio aos escombros e a escuridão, coroando o serviço de homens corajosos, que trabalharam bem. Máscara arriada, o salvador tem um semblante de alívio. Numa lição universal de otimismo, o menino levanta os braços abertos e dá um sorriso largo, aquele que, de tão inesperado e autêntico vai para a capa dos jornais e revistas. Renasceu sorrindo para as câmeras e para o mundo que precisava desse gesto e desse sorriso. Todos nós estávamos precisando muito disso! Nota do Editor: Mara Narciso é médica endocrinologista, acadêmica do oitavo período de Jornalismo e autora do livro “Segurando a Hiperatividade”.
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