Crônica jurídica
Quando minha filha nasceu, compreendi que a maternidade estaria presente em sua vida. Nos aniversários os presentes geralmente eram bonecas com cara de bebê, aprendeu a dar banho, fazer comidinhas e dar carinho, como que fosse um bebê de verdade. Assim é o caminho natural; as pessoas namoram, casam ou unem-se e têm filhos. Mas para muitos casais este sonho de ter filhos não se realiza, causando para eles uma grande frustração. Felizmente a medicina através das clínicas de fertilidade, tem se tornado a tábua de salvação para aqueles que precisam de ajuda, através da ciência para ter um filho biológico. Na longínqua França, em 1981, dois jovens de nomes Corine e Alain, passaram a conviver juntos. Poucas semanas depois, o jovem descobre um câncer nos testículos. Antes de submeter-se à quimioterapia, que ameaçava a esterilidade, opta em depositar seu esperma numa clínica. Pouco tempo depois, vem a falecer em virtude da doença. Corine procura a clínica para ser inseminada, mas os responsáveis pelo laboratório recusaram o pedido alegando, falta de previsão legal. A jovem bateu às portas do judiciário, onde se discutiu a titularidade do esperma depositado, bem como a existência de um contrato de depósito, alegaram os profissionais não haver um pacto de entrega do material, uma vez que o esperma da pessoa morta é coisa fora do comércio, e no território francês não havia legislação que autorizasse a fecundação póstuma. Depois de longo debate, a justiça determinou a devolução do sêmen à viúva. Infelizmente a fecundação não teve sucesso. Como importamos tudo, não poderíamos ficar de fora em 2008, um jovem casal procura uma clínica especializada para iniciar um tratamento de fertilização, na esperança de terem um filho. Após os exames de praxe, o marido deposita sêmen para congelamento, para posterior inseminação. Em 2009, é diagnosticado um câncer no jovem, em fevereiro deste ano ele vem a falecer. A jovem viúva procura a clínica para inseminação artificial, mas é negado este procedimento, sob alegação de que a autorização para fecundação após morte, só pode ocorrer se foi deixada autorização por escrito pelo depositante. Este é o entendimento adotado pelo Conselho Federal de Medicina e reforçado pelo Código de Ética Médica, que prevê punição para o médico, que realizar o procedimento sem autorização expressa. Reconhecendo o direito da requerente, o magistrado de primeiro grau proferiu decisão, em caráter liminar para que ela use o sêmen congelado do marido e faça a inseminação artificial. Por ser uma questão de justiça, e sem medo de errar, ouso afirmar que felizmente foi dado à jovem o direito da tão sonhada gravidez. Pois falar em maternidade, é falar em privilégio sagrado que só as mulheres podem sentir através desta pequena semente, tão débil e tão dependente, onde um único amor pode sustentá-lo. Nota do Editor: Ronaldo José Sindermann (sindermann@terra.com.br) é advogado em Porto Alegre, RS.
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