Crônica jurídica
O filme O óleo de Lorenzo é embasado em uma história real, de um menino que aos oito anos de idade é diagnosticada uma rara doença, que provoca a degeneração no cérebro, levando o paciente a morte em pouco tempo. Os pais do menino sem aceitar passivamente o diagnóstico, e diante da falta de medicamentos para o tratamento, iniciam uma batalha científica para melhor entender a doença, que destrói o cérebro do menino Lorenzo, deixando-o cego, surdo e paralítico incapaz de engolir e se comunicar. Recentemente em uma audiência na Justiça Federal do Paraná, entre um mutuário e o agente financeiro, o devedor pediu a palavra à juíza, pois queria explicar o motivo de sua inadimplência com a instituição, e contou a sua história. Formado em engenharia mecânica, parou de pagar as prestações da casa, quando abdicou da profissão, para pesquisar uma solução para degeneração cerebral, que comprometia a saúde de seu filho. A rara doença conhecida como “Gangliosidose”, caracterizada pela falta de uma enzima fundamental para reposição das células cerebrais, começou a se manifestar quando o menino tinha quatro anos. Inconformado começou a estudar a doença e descobriu que a enzima poderia ser produzida em farmácia de manipulação. Gastou na época cerca de 80 mil dólares e deixou de pagar as prestações da casa que foi a leilão. Segundo o pai do adolescente, que hoje carrega seqüelas irreversíveis vibra com a melhora do filho, que não tem mais dificuldades para engolir e a musculatura não é mais contraída como antes. Felizmente na abençoada audiência mesmo sem ter condições de pagar, teve a dívida da casa própria quitada com os valores dos depósitos das penas pecuniárias por decisão inédita de uma sensibilizada magistrada. Com certeza não há sensação mais assustadora do que escutar de um médico que a doença de um filho é rara e não tem cura. Bem que a vida podia nos poupar desse sofrimento, quando literalmente o mundo desaba aos nossos pés. Uma dor imensurável! A dor do destino que nós não traçamos, mas que temos que enfrentar sem saber como tudo terminará. Mas por pior que seja esta batalha tenhamos a certeza que encontraremos alguém para aliviar o peso dessa cruz, como na sábia sentença prolatada. Em uma memorável crônica “Nós, os órfãos”, o imortal escritor Moacyr Scliar, ressalta falta dos pais quando se vão: “Cometem a suprema traição, de morrer e de nos deixar. De repente, somos órfãos. E nós os órfãos, constituímos uma irmandade patética, espalhada pelo mundo inteiro. Varia a nossa idade, varia o nosso grau de instrução, o nosso status social. O que não varia é essa perplexidade que, a partir da orfandade, será um constante componente de nosso olhar vago, perdido”. Ao nos tornarmos pais, assumimos a pesada missão que não comporta a deserção. É a incumbência de estarmos vigilante todos os dias de nossa existência, e enxergarmos que os nossos filhos são uma benção de Deus. Nota do Editor: Ronaldo José Sindermann (sindermann@terra.com.br) é advogado em Porto Alegre, RS.
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