O filme “O Sentido da Vida” (The Meaning of Life, 1983), do Monty Python, em uma de suas cenas mais absurdas, típicas do humor escachado desse grupo, mostra um doador de órgãos atendendo à porta indivíduos que vieram buscar a doação... Ele protesta, alegando que ainda os está usando, mas os homens o jogam em cima de uma mesa e começam a tirar órgão por órgão, entre esguichos cenográficos e comentários do tipo: “não é esse!”, enquanto o “cobrador” conversa calmamente com a “mulher” do doador, discorrendo sobre o sentido da vida. Essa hilária cena non sense tem suas versões nem um pouco engraçadas em outros filmes e séries: O Imortal (The Immortal, 1970-1971), Coma (1978), Medidas Extremas (Extreme Measures, 1996), A Ilha (The Island, 2005), ou em casos reais do tipo: “boa noite, cinderela” ou de adoções “humanitárias” de portadores de deficiências mentais, por estrangeiros, com vistas à doação involuntária de órgãos. A história da doação de órgãos começou lá atrás, em 1954, quando foi feito o primeiro transplante de rim, nos EUA; e atingiu seu ápice em 1967, com o de coração. Na busca por salvar vidas, a ciência também enveredou pelo campo dos órgãos artificiais, da compatibilidade orgânica entre animais e seres humanos, da engenharia genética e outros caminhos, com ou sem questionamentos éticos e religiosos. Mais recentemente, as pesquisas com células-tronco trouxeram nova esperança - e polêmica - para contornar a rejeição orgânica e o hediondo tráfico internacional de órgãos. Paralelamente, a conscientização solidária aumentou significativamente a quantidade de doadores de órgãos e substâncias orgânicas. A doação de sangue entre humanos, por exemplo, existe desde o século XIX; e o primeiro banco de sangue surgiu em 1936, na Espanha. E por falar em doação de sangue, esta é uma das mais corriqueiras, menos “agressivas” e importantes, responsável por salvar várias vidas, cuja “pior” parte é a picada na ponta do dedo, para os exames preliminares... Mas existe outra doação que também não “tira pedaço” ou, melhor, o que tira é rapidamente reposto pelo organismo, sem sequelas para o doador: a de medula óssea. Por aférese (processo semelhante ao da hemodiálise) ou punção no ilíaco (e não da coluna vertebral, como alguns imaginam), ela é um dos principais recursos para o tratamento de pacientes com leucemia. Tenho a honra de conhecer Suely Walton, que doou por duas vezes, pelos dois processos. Salvou duas vidas! O cadastro de doadores de medula óssea é feito pela coleta de 5 a 10 ml de sangue, e o doador é inscrito no Registro Nacional de Doadores de Medula Óssea – REDOME. Para ser doador de medula óssea é preciso ter entre 18 e 55 anos, boa saúde e não ser portador de doença infectocontagiosa ou causadora de imunodeficiência. Existem vários hemonúcleos e hospitais capacitados para esse tipo de coleta (para maiores detalhes, clique aqui, mas o principal é saber que se trata de um ato de solidariedade que, como diz a amiga Suely, corresponde a “doar com amor, e não na dor”. O Brasil já tem o terceiro maior cadastro de doadores de medula óssea do mundo, mas ele ainda não é insuficiente para a demanda de um país tão miscigenado. Ao contrário dos filmes, séries e situações tristemente reais, mencionados no início deste texto, essas doações, conscientes, esclarecidas e espontâneas, com certeza contribuição para finais mutuamente felizes, física e espiritualmente falando. No mais, quem sabe o que nos reserva o dia de amanhã? Informe-se em sua cidade! Nota do Editor: Adilson Luiz Gonçalves é mestre em educação, escritor, engenheiro, professor universitário (UNISANTOS e UNISANTA) e compositor. E-mail: prof_adilson_luiz@yahoo.com.br.
|