Imagine como seria um debate em que não houvesse troca de acusações entre os candidatos, ocorrendo total harmonia entre ambos. Seria algo mais ou menos assim: Os candidatos sentam-se à mesa do debate, começando uma conversa bem animada, transparecendo que são velhos amigos que estão ali e não concorrentes pelo governo de um dos maiores países daquele continente. Como está para iniciar o programa, o mediador pede-lhes silêncio. Porém, os dois estão tão concentrados em sua conversa, que não percebem o aviso do jornalista. Ele novamente lhes chama a atenção e o programa começa. O mediador do debate, jornalista Lafaiete, então apresenta os dois candidatos. São eles: João Luiz Inácio da Silva que concorre pelos partidos de direita esquerdista e José Juvenal Serrado Prestes (mais conhecido como Juca), representado a esquerda direitista. Os dois aproveitam a apresentação e se cumprimentam novamente (já haviam feito isso ao chegarem à emissora). Eles se abraçam, dão tapinhas um nas costas do outro e sem perceber voltam a conversar entre si, no que são logo interrompidos pelo mediador que pigarreia e solicita que voltem aos seus lugares. Mediador - A primeira pergunta por sorteio será feita pelo candidato Juca ao candidato João. O assunto escolhido é sobre “saúde”. Juca - Boa noite a todos. Sei que o assunto é importante, mais aproveito o tema escolhido para perguntar ao meu oponente como está passando sua esposa. Pois, pelo que soube, ela estava sofrendo com uma terrível gripe. O mediador arregala os olhos, mas antes que possa dizer qualquer coisa o outro candidato responde. João - Agradeço a lembrança meu amigo e informo que ela está um pouco melhor. O remédio que você me recomendou foi quase milagroso. Aproveito para perguntar sobre a dor que o amigo tinha no braço, passou? Mediador - Cavalheiros, o assunto é sobre saúde pública, não sobre a saúde de vocês... Juca - Eu sei disso meu caro Lafaiete. Porém, não me sentiria bem em estar aqui falando de algo tão importante como o tema saúde, sem perguntar sobre a esposa de meu amigo e oponente, sabendo da doença dela. Por acaso acha que sou algum insensível? João - Não acredito que esta emissora pretenda nos proibir de sermos espontâneos. Acho o gesto do colega Juca louvável e digno... (neste momento o candidato João se emociona e é amparado por seu concorrente. Novos abraços e troca de agradecimentos, o que gera outra bronca do mediador). Assim vai transcorrendo o debate, em total harmonia. Sem acusações nem brigas (a não ser entre os candidatos e o apresentador) ou mesmo provocações. Mediador - Candidato João. Na área de segurança o que pode ser feito para diminuir os problemas que são hoje uma das maiores preocupações dos eleitores? João - Sei que a segurança está precária, mas os planos de governo de ambos propõem ótimas maneiras de se resolverem estes problemas. Mediador - Ambos? João - Sim, os meus e os de meu oponente. Por sinal os planos dele são excelentes. Muito bem elaborados. Tenho certeza que a segurança em suas mãos será muito bem conduzida. Por esse e outros motivos, quero deixar agora aberto meu voto em favor do concorrente Juca. Juca - João, você sempre consegue me surpreender, fiquei emocionado com suas palavras meu amigo, mas para mim você sim é o melhor candidato e aproveito este espaço para pedir a todos que estão nos assistindo para votarem em João para presidente. Dizendo isto, Juca abre sua camisa e mostra para as câmeras que está usando uma camiseta com propaganda política do seu adversário, onde está escrito: "EU VOTO NO JOÃO". Os dois novamente se abraçam. João com os olhos cheios de lágrimas agradece o gesto do amigo, mas diz ter certeza de que Juca é o melhor candidato. E para provar isto arregaça a manga de sua camisa e mostra uma tatuagem que fez no braço com os dizeres: "JUCA É O MELHOR, NELE EU VOTO". O mediador tenta novamente repreender tais atitudes dos candidatos, porém, ambos se unem contra ele. Começa uma troca de acusações entre o mediador e os dois políticos. Mediador - Vocês são loucos! Estão confundindo os eleitores com este comportamento. Vocês têm é que mostrar propostas e não ficarem se elogiando. Juca - Louco é você! Pois em um mundo tão cheio de ódio e violência, quando duas pessoas se dão bem, logo são acusadas de loucura por profissionais como o senhor, que deveria estar mediando este debate e não nos criticando. João - Apóio meu colega. O senhor Lafaiete não tem condições de conduzir um debate de alto nível como este, pois quer é ver o circo pegar fogo para dar ibope a sua emissora. Quer que nós candidatos, fiquemos acusando um ao outro de forma irresponsável, para assim vender mais jornais. A partir daí o tumulto é geral, mas aos poucos os ânimos vão se acalmando, os dois candidatos e o mediador acabam fazendo as pazes e o debate continua. Ao final de duas horas de programa, o mediador anuncia que serão feitas naquele momento as últimas considerações dos candidatos, onde cada um deverá se despedir do público e de seu oponente, encerrando sua participação. Passando a palavra ao candidato Juca. Juca - Quero agradecer a todos os telespectadores que estão assistindo a este debate. E aproveito os últimos minutos para convidar meu oponente e sua equipe para uma partida de futebol lá em minha chácara, dando chance a eles de se recuperarem das derrotas sofridas nos dois últimos jogos onde perderam para o meu time. João - Agradeço o convite, mas lembro ao amigo que só perdemos, pois o juiz que apitou o jogo era seu cunhado, que em atos desonestos favoreceu seu time, que por sinal só ganha uma partida dessa forma. Juca - Olha camarada, se o seu time não sabe a diferença entre uma bola e uma pedra não posso fazer nada, agora não arranje desculpas pelos seus fracassos nas partidas, a não ser que estejam com medo de jogar... João - Medo? De um bando de pernas de pau? Só porque você quer seu #@!%">#@!%&!!. Ladrão safado... Juca - Ladrão é você e aquele seu time de #@@&*(&@!, como toda aquela cambada de seu partido! O mediador termina o programa às pressas, enquanto os candidatos rolam pelo chão aos socos e pontapés, encerrando assim um dos debates mais amistosos politicamente que já se teve notícias. Provando que as divergências políticas podem ser superadas, porém, quando o assunto é futebol... (durma-se em 2014 com esse barulho). Nota do Editor: Antonio Brás Constante (abrasc@terra.com.br) é escritor.
|