Há alguns anos atrás combinei de encontrar meu amigo na Livraria Cultura da avenida Paulista. Por causa de seu trabalho ele praticamente não tinha residência fixa, era um andarilho solteirão e solitário. Estávamos tentando marcar aquele encontro havia já alguns meses para colocar a conversa em dia, como nos tempos da faculdade. A livraria foi apenas o ponto de encontro para o filme que iríamos assistir. Naquela época Dan Brown emplacava seu livro em todas as listas de mais vendidos do Brasil e do mundo, a vitrine da livraria estava quase toda vermelha com a capa de "O código da Vinci". Entusiasmado como ele era pelo autor, a nossa conversa não poderia ter sido outra. Tomamos um café e comemos um brownie em uma cafeteria do Conjunto Nacional, enquanto aguardávamos o início do filme no recém-fechado Cine Bombril. "Estorinha mirabolante aquela que o Dan Brown criou, está vendendo horrores", comentei. "Não é só uma estorinha, tem alguma fundamentação histórica. Mas se é fato ou não, oras, quem se importa? Há até quem diga que o próprio Jesus não existiu e isso não muda nada. A questão toda é o significado e as ideias que a versão de Brown transmite. Acho interessante o Santo Graal simbolizar Maria Madalena, a mulher que Jesus amou. Não há nada de profano em exaltar a união do masculino e feminino", respondeu ele com ares de seriedade. Apesar de parecer sugerir fatos sobre a vida de Jesus, o livro é declaradamente ficção. E se o autor conseguiu vender quantidades astronômicas do livro em tantos países diferentes, o mérito existe e é dele. O livro é popular, atraiu a atenção da mídia e o interesse dos leitores, elogiado por uns e criticado por outros, foi um fenômeno editorial - isso é indiscutível. Terminado o filme, voltamos à livraria para comprar alguns livros. Minha esposa, que estava fazendo um curso no Centro Cultural da Vergueiro, veio ao nosso encontro. Jantamos em um restaurante japonês no bairro da liberdade, a conversa regada a sashimi e sakê foi bem animada e descontraída. Depois desse encontro, há mais de seis anos atrás, só voltei a falar com meu primo pela internet. A mais recente notícia que tivemos dele foi que, em uma viagem a trabalho para a França, ele conheceu uma brasileira que morava temporariamente em Paris com quem se apaixonou e hoje está noivo. Lembrei-me de Dan Brown e sua estória mirabolante. À semelhança de seu herói Robert Langdon que descobriu o segredo do Santo Graal - Maria Madalena, segundo o livro -, meu primo descobriu Sofia. Por causa do trabalho ele continua um andarilho, mas não é mais solteirão tampouco solitário. Não sei quão arduamente ele a procurava, mas hoje parece muito feliz bebendo do amor em seu cálice sagrado.
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