Sentados lado a lado na espera do consultório de psicologia. Ela conta em silêncio os ladrilhos do chão. Ele incomodado com a indiferença dela. - Oi... - Oi... - Desculpe, mas você parece meio triste, preocupada... - É, eu tô... - Coisa grave? Se quiser conversar... - Pois é... Tô aqui esperando a doutora, mas a cabeça tá longe... - O que houve? - Não tô bem, sabe? Não tô mesmo... Parece que eu não sou eu. Perdi minha identidade... Opa! Bom começo de papo. Ele animado de repente. - Sei o que diz. Já passei por isso... Ela intrigada, um súbito interesse nele. - Já? - Já! - Então sabe a sensação horrível que se sente... - Sei, sei sim. A gente se sente vazio, sem referência, solto no mundo... Ela sorri cúmplice. - Exatamente! É como me sinto agora... Ah, que bom que me entende. - Aposto que sei o motivo... - Sabe? - “Paixão cruel, desenfreada”, como diria Cazuza, né? Daquelas que chegam pra matar. A gente se entrega tanto que se perde de si mesmo... - Como? - Então... A gente se confunde na vida do outro, não sabe mais quem é quem... - Hã... - Faz muito tempo? - O quê? - Que perdeu a identidade? - Não, hoje de manhã, deve ter caído quando desci do ônibus... - Hã?
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