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COLUNISTA
Marcelo Sguassábia
04/10/2010 - 12h15
Último movimento
 
 

I

- Dizendo quase nada você entrega o que se passa e não percebe. É impressionante essa sua, digamos, faculdade da transparência.
- O problema é esse. Disfarçar não sei, nem quero. Sou um edifício em construção contínua e onde se vêem todos os andaimes, mal comparando é bem por aí. Quando rio ou choro por dentro é coisa que faço com as mãos, com os pés, com as tripas todas e especialmente com os olhos. Fica muito escrito na cara. Não tenho agenda oculta, meu amigo. Allegro é Allegro, Andante é Andante, Presto é Presto. Tudo o que mais quero agora são menos holofotes, coletivas, autógrafos. Uns dias de folga para tocar o piano de dentro, um mofo bom de estância velha em cama estreita e sem conforto.

II

- Você sofre com o fato de espalhar brilho por onde anda e a vontade de passar pelo mundo desapercebida. Minueto perdido de Mozart num escombro da Segunda Guerra, no fundo é isso o que você queria ser, uma gema rara mas ao mesmo tempo uma ruína sem chance de descobrimento ou reconstituição. No entanto você existe, foi revelada e está sob uma redoma de relicário há vinte e tantos anos. Não há como voltar atrás nessa aura que acabaram fazendo em torno de você, mesmo contra sua vontade. Você é uma estrela. Assuma o que há de angustiante e de glorioso nisso.

III

- Eu quero ser o cara que vira a página da partitura, não a diva do piano. O cara que vira a página vive da repetição, eu não posso me repetir. Nem por isso ele passa fome, é bem pago pra ficar virando a página. Satisfaz-se assim e vive no baixo risco, em boa zona de conforto. Ninguém pode condená-lo ou dizer que esteja errado.
- Não é ele, é ela. Usa até trança e é loira, não reparou? E como é imenso o fosso entre a ideia de felicidade dela e a sua. Pergunte a ela se não gostaria de ser você, por meia hora que fosse.

IV

- Chega de calmante, está aumentando a dose e não está se dando conta. Qualquer dia dorme em cima do teclado, no meio do concerto.
- Durmo nada. Calmantes são parecidos com a moça que vira a página, uma rede de segurança. É bom saber que ela está lá, mesmo conhecendo a música de cor. Sem eles eu suaria frio, e as teclas molhadas me fariam errar as notas. Calmantes me põem no piloto automático. Servem de consolo, na falta de cama estreita em estância velha.
- Não é possível que você despreze tanto um dote raro de nascença.
- Artistas de verdade são autodestrutivos, nunca ouviu falar? A música que tenho basta e sobra. E o que sobra eu estou farta em dividir. Cancele a agenda de amanhã ou eu tomo a caixa toda.


Nota do Editor: Marcelo Pirajá Sguassábia é redator publicitário em Campinas (SP), beatlemaníaco empedernido e adora livros e filmes que tratem sobre viagens no tempo. É colaborador do jornal O Municipio, de São João da Boa Vista, e tem coluna em diversas revistas eletrônicas.
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