Um sol quente na gostosa manhã e o trinado de pássaros e cigarras dava a sensação de que o verão acabara de chegar. Era 25 de dezembro. Na porta da casa uma menina de uns dez anos, contemplava o velho muro que vedava a entrada do imóvel em que morava. Já tinha olhado em todas as janelas, todos os muros, inclusive os laterais, e nada de presentes, como acontecia todos os anos. Tinha passado a noite em claro, esperando o dia clarear, imaginando como seria a aurora daquele dia. Tinha visto, há dias, no quarto de seu pai, uma fantasia vermelha e branca de Papai Noel, umas madeiras e ferramentas. Seu pai era servente de pedreiro e acabara de sofrer um acidente na obra. O andaime em que trabalhava despencou, quebrando uma de suas pernas, o que o deixou semi imobilizado. Só conseguia andar de muletas. Enquanto lembrava desse triste acontecimento, a menina observava o portão que dava acesso para a rua de sua casa. Viu, em frente ao portão, uma moça, com enorme sacola nas costas. A moça também a viu e bateu palmas. A menina foi atender, e, antes mesmo de chegar ao portão, a moça já foi perguntando: - Seu pai mora aí? - Quantas crianças tem aí? - Quanto seu pai ganha? A menina retrucou: - Você é do Censo? - Não, respondeu a moça. Meu pai é rico e eu decidi comprar uns brinquedos e distribuir para as crianças pobres. - Mas você é mulher, não está vestida de Papai Noel e nem poderia representá-lo. Não teria graça. - Papai Noel? Papai Noel não existe. É fantasia de criança pobre, afirmou a moça. - Já vi que você não entende nada de fantasia de criança pobre. Deve ter ganho presente demais de seu pai rico e não sabe nada de Papai Noel, disse a menina, com rubores em seu rosto infantil. A moça, já um tanto embaraçada, arriscou a pergunta: - Você não quer um presente meu? Enquanto pensava na resposta, surge na porta, de dentro da casa, um Papai Noel de muletas, segurando um coração feito em madeira, preso contra a muleta, em sua mão direita, perfeita obra artesanal, com uma frase central, parece que escrita com sangue e emoção: “Eu te amo”!!! - É para você, disse o Papai Noel de muletas, se dirigindo à menina e quase caindo ao tentar desprender o presente. A moça, meio sem jeito, perguntou: - É seu pai? A moça rica olhou para a menina e desabando em choro, desabafou: - Desculpe! Eu ganhei muitos presentes caros no Natal, mas nunca conheci o meu Papai Noel!
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