Nunca chame um deputado ou senador de "meu caro parlamentar". Como dizem os antigos, a verdade dói. E, em certos casos, pode até ofender. E também, por favor, não pergunte onde esteve a imprensa durante todo esse tempo, que não nos contou que a tendência dos nobres parlamentares (tendência suicida, em termos de normalidade democrática) era esbofetear seus eleitores, aproveitando que a eleição já passou e que o clima de festas de fim de ano é mais propício à lassidão, à contemporização, ao deixa-estar-para-ver-como-é-que-fica. Porque houve planejamento: a data foi escolhida a dedo, depois da eleição, já no fim do ano legislativo, mas não tão perto do fim que faltasse gente para votar, se fosse necessário. E se fez a votação simbólica, aquela votação covarde de que só participam os líderes e na qual os nobres parlamentares não precisam se expor. A história de que Suas Excelências desejavam aumentar os próprios salários ao nível dos pagos aos ministros do Supremo Tribunal Federal circula faz tempo. Mas os meios de comunicação nunca a tomaram muito a sério: afinal de contas, os ministros do Supremo são onze, os nobres parlamentares são 594, e já recebiam, além de 15 salários por ano, mais uma imensa manada de vacas leiteiras onde buscar um capilezinho a mais – do auxílio-paletó, para que possam vestir-se condignamente, à altura da importância que se dão, até auxílio-moradia e passagens aéreas para suas bases eleitorais, mesmo que residam e sejam domiciliados desde criancinhas no Distrito Federal. O problema é que a imprensa esqueceu os antecedentes deste pessoal, que foi capaz de pegar passagens aéreas de serviço e utilizá-las em viagem de lazer, com namoradas, esposas e acompanhantes. Faltou reportagem, enfim. Faltou vigilância da imprensa, ainda mais sabendo-se que se trata de gente que precisa ser vigiada. Bastou que a imprensa se interessasse pelo caso que a volta dos bingos foi derrotada (embora vá voltar já no início do ano, assim que o Legislativo retomar os trabalhos). Repórter no Congresso, pois; mais repórteres, para que a imprensa não tome dribles humilhantes dos Garrinchas da auto-ajuda. Nota do Editor: Carlos Brickmann é jornalista e diretor da Brickmann&Associados.
|