Decorridos trinta anos de sua morte, o presidente Salvador Allende será alvo da investigação promovida pelo Ministério Público em Tribunal de Apelações de Santiago.

A tragédia, ocorrida em 11 de setembro de 1973, ainda não foi suficientemente esclarecida e se insere no rol de outros 725 casos de violações aos direitos humanos ocorridas durante a ditadura do golpe de Augusto Pinochet.

Esta providência não constituiria surpresa se lavada a cabo no governo da ex-presidente Michelle Bachelet. Como Bachelet era de esquerda, tendo sofrido as agruras do regime Pinochet, era de se esperar que se interessasse em trazer a público as circunstâncias em que se deu a morte de Allende.

Isto não ocorreu, inobstante o empenho do deputado comunista Hugo Gutiérrez, presidente da Comissão dos Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, para que se promovesse uma investigação judicial capaz de explicar e justificar a morte do ex-governante tanto aos chilenos, como à comunidade mundial.

Segundo aquele parlamentar, “qualquer pessoa que morre em uma esquina de uma cidade do Chile é objeto de uma investigação processual. Assim, é patético que no caso do ex-presidente Allende nunca tenha sido feito uma”.

A versão mais conhecida da morte do líder socialista é a de Allende suicidara-se com um tiro de fuzil no interior do palácio La Moneda, quando era bombardeado por Força Aérea chilena.

Subsistem, ainda hoje, sérias dúvidas quanto ao resultado da autópsia de Allende, que não foi suficiente para caracterizar o seu suicídio, tal como veiculado pelas autoridades militares. A iniciativa ora adotada partiu da promotora Beatriz Pedrals, no Tribunal de Apelações de Santiago.

O atual presidente da república, Sebastián Piñera, embora sendo de direita, partidário de facção opositora a de Allende, externou sua concordância com a instauração do processo investigatório, não divisando, nessa providência, qualquer ato de vindita ou represália ao seu governo, nem as conclusões do governo Pinochet.

Conforme afirmou a sua porta-voz Ena von Baer, não é de estranhar que a ocorrência seja reapreciada, mediante elementos capazes de esclarecer se realmente houve auto-extermínio ou se a morte de Allende resultou somente da atuação das forças que o combatiam.

O juiz Mario Carroza, que presidirá o processo, foi incisivo ao afirmar: “obviamente recorrerei a todo elemento, testemunha ou documento ou antecedente que for necessário”.

A presidente do Grupo de Familiares de Detidos Desaparecidos, Lorena Pizarro, também manifestou-se favorável a aclaração do fato, partindo do princípio de que “nenhum crime deve ficar sem ser investigado”.

Com isto, tornou certo que a averiguação não será um simulacro, estando fadada a atingir a sua finalidade. Allende foi derrubado pelas forças conservadoras, tendo sido alvo da atuação da CIA apoiada por outras ditaduras militares, incluindo a brasileira.

Não é de se estranhar que, no curso da sindicância, autoridades dos países vizinhos venham a prestar esclarecimentos que possam concorrer para a elucidação do que ocorreu em 11 de setembro de 1973, no palácio La Moneda.

Nota do Editor: Aristoteles Atheniense é Conselheiro Nato da OAB e Diretor da ACMinas.