Muitos que se aposentam têm este sonho. Poder caminhar na orla marítima pela manhã, ver o nascer do sol, ficar longe dos congestionamentos diários... Enfim, viver no Paraíso.

Sonho concretizado, chega a hora do pesadelo.

Os familiares que quase nunca nos visitam, ficam cheios de saudade e vêm fazer “aquela” visitinha. E a visitinha começa na véspera de um feriado prolongado. Chegam sempre de madrugada, devido ao congestionamento na serra, e aos gritos e ao som de buzina. Com toda aquela alegria, começam a descarregar o carro, que tem lugar para cinco pessoas, mas para a felicidade do fabricante, cabem dez. Mais os colchonetes, travesseiros, malas, sacolas, cadeiras, bolas, pranchas e, lógico, pra ajudar nas despesas de alimentação, um saco de laranjas e caixas e mais caixas de latinhas de cerveja.

Neste momento, você percebe que será o final de semana mais prolongado de toda a sua vida. Educadamente, você alerta que não há lugar para todos, mas eles não se importam, dormem em qualquer lugar. Sua casa está agora invadida por seres inimagináveis, que acordam cedo para aproveitar a praia e ainda têm a consideração de avisá-lo de que não precisa se preocupar, pois voltarão bem tarde para o almoço. Que suplício! Você ora a Deus para que comece a chover e, assim, quem sabe, vão embora.

Seu pedido é atendido. Chove, e como chove. Piora tudo. Ficam todos presos em sua casa de um quarto, um banheiro e uma pequena sala. Afinal, era somente você e sua esposa. Seu programa favorito na TV? Pode esquecer, as crianças berram pelo Cartoon. Suas viagens pela internet? Acabam de ser canceladas pelos sobrinhos dos sobrinhos que vieram talvez te conhecer. E cada um com um aparelho de celular, tocando música, ou melhor, ruído de variado mau gosto. Fone de ouvido? Nem pensar. O negócio realmente é a disputa de quem toca mais alto. Você pensa que o final do mundo realmente está próximo, pois uma das pragas, “os gafanhotos”, acabaram com sua despensa mensal e você está somente no primeiro dia da tortura. Quando vai para a cama tentar dormir, reza de novo, suplicando pelo sol para que todos fiquem na praia.

Desejo atendido. Amanhece e você, para evitar a loucura do dia anterior, já prepara individualmente café para todos. Os pães, você foi buscar, enfrentando fila às 6 horas da manhã. Você não se esquece de preparar nem as mamadeiras, tudo para adiantar a ida deles à praia.

Na penúltima noite da desastrosa estadia, todos estão como camarões. Ninguém encosta em ninguém. Gemidos, mau humor por todos os lados tornam sua casa a visão do inferno. Em meio ao caos instalado, você tenta encontrar os seus chinelos. Pergunta se alguém os viu. Afinal, estavam desaparecidos desde que as visitas chegaram. O amigo do amigo do seu sobrinho responde que pegou emprestado. E você, que nunca orou tanto, pede, implora, suplica aos céus, que acabe o feriado. Mais uma vez, pedido atendido.

Todos se vão e, agora, olha ao redor e nem reconhece mais sua casa: sujeira, desordem, danos, despesas... SOCORROOOOOOOOOO!

Em estado de cama, após este lamentável episódio, você se recorda que, na mocidade, quando os filhos ainda eram crianças você também visitava aquele tio de quem nunca mais teve notícias. Agora, dá para entender. E, compreensivo, concluirá que, sabiamente, seu tio mudou e não deixou endereço. Será que ele ficou bem? Com certeza! O que ele e você querem é sossego. Agora, para saber como andam os parentes, bastam os sites de relacionamentos. Viva a modernidade! Endereço? Só o virtual!