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SEÇÃO
Crônicas
09/06/2011 - 15h09
Chuva no mar
Rangel Alves da Costa
 

Tenho o mar como um lindo e caudaloso verso molhado, poesia mais pura que me encanta quando quero compartilhar das belezas da natureza.

Tenho a chuva como poesia amargurada, sofrida, que vai caindo de cima como a lágrima que começa a se derramar dos meus olhos.

Tenho mar e chuva como um belo livro de poesias, infindas e envolventes, tristemente constantes, que turvam o meu olhar e me molham também por dentro.

Tenho a chuva no mar, ou o mar bebendo a chuva, ou a chuva buscando ser água de mar, ou o mar egoisticamente sedento e ávido da doçura que cai na sua imensidão salina, como uma colcha onde se misturam verdades e sentimentos.

Tenho o meu olhar se deitando sobre a água do mar porque sei que é tarde, quase no instante que a nuvem de sempre vem passear e jogar suas mágoas na beira da praia. Como um relógio aflito para chegar um momento, sinto quando cai o primeiro pingo e da água se levanta o susto para depois tudo se misturar.

A água do mar toma um susto e sobe um pouquinho com o pingo de chuva porque o sal nem sempre está acostumado com o adocicado que surge. Quando o pingo bate se assusta e abre a boca, subindo um pouquinho, na esperança que outro pingo venha cair ali.

Quando a chuva começa a ficar mais forte, quando não são mais pingos esparsos, mas uma torrente de água que vai se despejando sobre a outra água, então se observa o encontro de dois mundos molhados que se atraem como se fossem amantes.

E são amantes. São delirantemente amantes porque a água do mar se espalha silenciosa esperando que venha de cima aquilo que possa lhe alegrar a vida. E sem a chuva que venha açular o coração sossegado, a tendência é que a solidão e o abandono tomem conta da água que quer amar.

Quando os dois se encontram, se batem, se juntam, o pingo e a água, se abraçam e se entregam, um entrando no outro, se misturando, ser metade do outro e tudo ser, o que se vê é o caminho aberto, numa estrada molhada, sem que ninguém saiba bem qual o percurso que fazem dali por diante.

Quem está na beira da praia, na beira do mar, na margem desse mundo de água, e de repente sente que lá por cima as nuvens se aproximam e logo se abrirão para as chuvas, certamente não abrirá guarda-chuva senão abrir os braços, erguer a cabeça para o alto e esperar que tudo aconteça.

Os pingos que caem, na junção do murmurejar da água que se intensifica, forma um cenário audível que somente os sentimentos sabem explicar. O barulho barulha, borbulha, murmureja, enseja o espírito em viagem, o corpo em voragem querendo nudez, querendo voar, querendo correr, querendo partir, querendo seguir para as águas, para o fundo da praia, viajar pelo mar.

Depois, num instante, rompante, tudo vai ficando mais calmo, mais silencioso, mais apenas chamado para ouvir ainda a água batendo na água, e o que se ouve é como um toque na porta da memória, um leve chamado na lembrança, numa saudade que dá vendo tudo de novo de olhos fechados.

Quem dera essa tarde/noite, esse vento/açoite, essa lembrança/andança, essa dança, essa dança, esse bailado não fosse somente azucrinando a alma, tirando a calma, gritando por dentro, mexendo por dentro, trazendo a vontade de voar/viajar sem sair do lugar.

E tudo vindo da música, do canto, da poesia, da melodia, de todos os sons que são trazidos pela onda que vem chegando devagarzinho para dizer que abra os olhos e veja e sinta quanto tudo na vida é dolorosamente maravilhosamente, nesse amar/desamar, que contenta e mata, que alimenta/arrebenta, como a chuva no mar.

E agora é noite. Já faz frio, faz muito frio. E o que será aquela réstia de cabelos esvoaçantes que continua na beira do mar, dizendo que vai buscar nas profundezas os pingos que afundaram e pertencem ao seu olhar?


Nota do Editor: Rangel Alves da Costa é poeta e cronista. Mantém o blog Ser tão / Sertão (blograngel-sertao.blogspot.com).

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