A vida começa de cabeça pra baixo. A gente fica uma cara, dentro da barriga da mamãe, de cabeça pra baixo. E dentro d’água! Aí é soda. Mas aqui fora, sempre me falaram pra andar de cabeça erguida, ombro armado, peito pra fora, barriga pra dentro e nariz empinado. Tá bom, mas e se eu pisar na m..., quem vai me ajudar a limpar? É, porque falar é fácil, quero ver é manter a tal de cabeça erguida com um monte de gente te dando pedala Robinho na nuca à toda hora, todo instante. Eu ouvia Sepultura, hoje ouço Cranberries. Comia ovo colorido de boteco, hoje barrinha de cereal. Caracas, tô ficando velho, já passei dos trinta e minha estabilidade financeira não veio ainda. Ah, é até os quarenta que eu devo tentar? Ufa, já ia puxar o gatilho. Sempre estudei. Meu pai sempre me disse: ”Filho, estuda pra não ser um vagabundo que nem estes teus amigos, que ficam o dia inteiro com o saco dentro d’água do mar pegando onda. Bando de maconheiros!” Hoje em dia, a maioria tá bem melhor que eu, morando melhor, com carrão do ano e o cassete. Já viajaram pro Havaí, pra Europa, Indonésia, e eu pra Peruíbe e Mongaguá. O que saiu errado? Acredito nas pessoas, sempre acreditei no ser humano, o topo da evolução. O homem, esse mesmo homem inteligente, esperto, que se preocupa mais se o time dele vai se dar bem no campeonato brasileiro, do que com as jogadas maravilhosas que os nossos parlamentares fazem lá em Brasólis. Esse prodígio da natureza, que graças ao cérebro desenvolvido pela seleção natural, guarda de cabeça a escalação da seleção das últimas cinco copas do mundo, mas não lembra em quem votou pra vereador no ano passado. De cabeça pra baixo. Como é que eu vou falar pro meu filho estudar, se um nó cego qualquer entra no BBB e ganha uma fábula de dinheiro? Você tem poucas chances de mudar, mudar de verdade a sua vida. De ser alguém, ou ser apenas parte dela. A minha cultura pode ser inútil para os outros, mas é vital para mim. O seu time não é melhor nem pior que o meu. Se o seu bilau é maior, sorte ou azar de quem for transar com você. É uma questão de ponto de vista. Estar com os pés no chão. Ou de cabeça pra baixo.
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