Conheci a história do Quilombo da Fazenda em Ubatuba, através do livro “Eu tenho o meu sonho” de Moacyr Pinto e “Tradições Culturais do Quilombo da Fazenda” de Tamara Oliveira. Depois conheci pessoalmente a Lúcia e a Laura, líderes comunitárias do Quilombo que estiveram em São Sebastião e fizeram seus depoimentos. Primeiro achei que escreveria uma poesia sobre o assunto, mas me rendi a esta crônica, acho que a poesia deveria ser do Chico Buarque de Holanda. Já escrevi sobre as fazendas de café, de cana de açúcar, sobre os escravos, sobre os afros descendentes, mas nunca me vi diante de uma história tão linda. Como eu poderia imaginar que os descendentes dos escravos reivindicariam a terra de uma fazenda e depois da invasão e enfrentamento seriam considerados os donos do local? Isto soa como poesia para os meus ouvidos, fico imaginando como o Vinícius de Moraes escreveria sobre o assunto... Claro que eu sei que o brasileiro na sua maioria é descendente dos escravos, e que a miscigenação é bem clara quando andamos na rua ou visitamos o pátio de uma escola. Mas essa história que aconteceu em Ubatuba e em outras comunidades quilombolas pelo Brasil afora, é a coisa mais justa que já registrei em minha vida. Como não me sinto capaz de fazer uma poesia com este assunto, pego carona aqui no verso de Castro Alves: “São os filhos do deserto, Onde a terra esposa a luz, Onde vive em campo aberto, A tribo dos homens nus, São os guerreiros ousados, Que os tigres mosqueados, Combatem na solidão, Ontem, simples, fortes, bravos, Hoje míseros escravos, Sem luz, sem ar, sem razão...” Não Castro Alves,... com luz, ar, terra e razão.
Nota do Editor: Maria Angélica de Moura Miranda é jornalista, foi Diretora do Jornal "O CANAL" de 1986 à 1996, quando também fazia reportagens para jornais do Vale do Paraíba. Escritora e pesquisadora de literatura do Litoral Norte, realiza desde 1993 o "Encontro Regional de Autores".
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