Com grande facilidade nos esquecemos, principalmente do que não deveríamos esquecer e, com a mesma facilidade, nos entregamos as mais diversas distrações que, atualmente, chamamos de entretenimento. Fora de nosso soturno trabalho temos nosso tempo livre preenchido com as mais parvas ocupações e, provavelmente, a que mais ocupa o centro de nosso ser é, sem dúvida alguma, a programação televisiva. Estima-se que o brasileiro, em média, assiste cinco horas por dia de televisão. Cinco por dia, trinta e cinco por semana. Talvez um pouco mais ou, quem sabe, um pouco menos. Enfim, cada caso é um caso singular de desperdício de tempo, de desumanização visível de uma vida. Evidentemente que esse estado de coisas empobrece, significativamente, a humanidade de nossa sociedade turvando o caráter de cada um dos membros desta choldra ignóbil chamada Brasil. Pior que isso! Como nos adverte Wolfgang Smith, em “O demônio da distração”, esse cenário em que encontramo-nos inseridos está levando-nos a perda de nossa inteligência mais elevada, de nossa liberdade e, em suma, daquilo que realmente nos caracteriza como humanos. Tamanho é o grau de insanidade que hoje se assenhora das almas destas paragens que muitíssimos são os que veem com grande naturalidade a vulgaridade e a baixeza tomarem assento ao centro da vida social e, consequentemente, de nossa pessoa. Bem, quando afirmo isso, não estou a pedir para que aponte o seu dedo sórdido para os exemplos que abundam a nossa volta e que se fazem reinantes nos canais de televisão, mas sim, para o seu olhar embasbacado diante de tudo isso, fixado, sem mover um milímetro da fanfarronice midiática. Se não o movemos não é porque a televisão tenha uma força hipnótica sobre nossas almas, ou porque seus senhores recorram aos mais variados subterfúgios para nos escravizar. Eles até usam, mas não é por isso não, meu caro, que agimos assim. Procedemos deste modo porque, à sua maneira, a TV é uma infernal maquinaria de Narciso, um espelho que reflete em sua tela as sombras mais vulgares que habitam em nosso íntimo projetando-as no centro de nosso ser. Ela apenas maximiza os nossos desejos mais secretos. E se corremos por essas veredas é porque somos seres volitivos, porque permitimo-nos a fraqueza. A procura pela plenitude, pelo crescimento em Espírito e Verdade foi varrido para debaixo do tapete de nossa história pessoal e civilizacional e substituída pela desídia moral e intelectual que, similar a Rainha de Copas, passa a ditar regras sem sentido para nossas vidas vazias e sem propósito.
Nota do Editor: Dartagnan da Silva Zanela é professor e ensaísta. Autor dos livros: Sofia Perennis, O Ponto Arquimédico, A Boa Luta, In Foro Conscientiae e Nas Mãos de Cronos - ensaios sociológicos; mantém o site Falsum committit, qui verum tacet.
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