A exemplo do ocorrido há pouco mais de 50 anos, quando Juscelino Kubitschek privilegiou o desenvolvimento da indústria automobilística, então em fase de implantação, o Brasil de hoje insiste no apoio a esse setor de grande importância para a economia e para a qualidade de vida. Desde 1995, época do início das privatizações, as gestões do governo federal têm apoiado a produção de veículos, levando em conta a expressiva participação dessa indústria na geração de empregos, renda e impostos. Apesar do evidente desenvolvimento da economia brasileira nos últimos anos e da opção governamental de conceder uma série de serviços públicos à iniciativa privada, percebe-se um grave problema: o modelo de atuação do Estado por meio das agências reguladoras é frágil. Os seguidos casos de conflitos e de paralisia demonstram que tal modelo não atinge o objetivo de garantir a equiparação de investimento x preço x qualidade e responsabilidades. Exemplos claros são os setores de eletricidade, saneamento e transportes. Na área de transportes, em que o Brasil, já nos tempos de JK, abandonou a alternativa das ferrovias e se concentrou nas rodovias, a situação é gravíssima. Como se sabe, a concessão de exploração e manutenção de estradas por empresas concessionárias exige contrapartida por parte das detentoras dos serviços. Ao serem assinados contratos entre governos e empresas, fica estabelecida a obrigação das concessionárias de conservar, ampliar e desenvolver as importantes artérias tanto no âmbito federal quanto no estadual. Nem sempre tal compromisso é cumprido. Não bastasse isso, governos estaduais e municipais relegam a segundo plano o investimento em modais públicos de transporte. O Estado de São Paulo, tão populoso e desenvolvido, sofre com os problemas de mobilidade urbana. Hoje em dia, temos ruas e estradas congestionadas, implicando, inclusive, a perda de atratividade de empresas. Diante dessas barreiras, municípios paulistas chegam a ser preteridos quando da aplicação de investimentos por novas empresas da indústria e do comércio. O setor de desenvolvimento urbano, ao qual estão integrados o Secovi e a Aelo - entidades que representam os empreendedores formais -, vem suprindo, há muito tempo, investimentos públicos ou de concessionárias. Por parte das concessionárias, esses investimentos são deficitários, quando não inexistentes, nos serviços de saneamento e de eletricidade. A ser seguida a lógica de transferência de responsabilidades, tudo indica que será exigida do setor imobiliário a solução pela falta de investimentos em transporte público ou mesmo nas estradas de acesso às cidades. Já passou da hora de cada um assumir suas responsabilidades: ao governo, cabe fiscalizar as concessionárias e cobrar a aplicação de investimentos nos serviços; a União, Estados e Municípios devem exigir o cumprimento daqueles compromissos; e a iniciativa privada deve manter estreita cooperação com a administração pública. O setor de desenvolvimento urbano é baseado em leis e sofre intenso aparato de fiscalização para a consecução de suas obrigações. Os prazos são expressos e transparentes, inclusive com garantias de ordem penal. Os números demonstram que esse setor é um dos grandes responsáveis pelo crescimento da economia e, portanto, tem o direito de manifestar à sociedade sua posição diante de distorções e graves riscos. Somos a favor da participação da iniciativa privada na resolução dos gargalos de investimentos em serviços públicos essenciais, mas o atual panorama mostra um modelo de regulação que fugiu do propósito inicial de universalização, concorrência e preços justos aos consumidores. Nota do Editor: Caio Portugal é vice-presidente de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente do Secovi-SP (Sindicato da Habitação) e presidente da Aelo - Associação das Empresas de Loteamento e Desenvolvimento Urbano.
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