Num país como o nosso, que viveu por muitos anos mesclando a democracia e o autoritarismo, tornou-se hábito desqualificar o Poder Legislativo. E o pior é que, na maioria das vezes, os próprios integrantes desse poder fornecem os elementos para a desqualificação. Dias atrás, o painel eletrônico da Câmara Municipal de São Paulo registrava a presença da maioria dos vereadores à sessão, mas o plenário estava vazio. Aí descobriu-se que a presença dos vereadores - inclusive os ausentes - era registrada por um funcionário que, depois de revelado o procedimento, entrou em férias. O país também se recorda do episódio dos senadores Antonio Carlos Magalhães e José Roberto Arruda, que tiveram de renunciar porque violaram o sigilo do painel eletrônico do Senado. Mas, além desses, existem muitos outros exemplos de má gestão de painéis eletrônicos e do controle da presença dos parlamentares nas sessões do Congresso Nacional, Assembléias Legislativas e Câmaras Municipais. É voz corrente na população a existência do parlamentar gazeteiro, assim chamado porque ganha o subsídio mas não comparece às sessões. Os anais das casas legislativas registram a cassação dos mandatos de alguns deputados e de vereadores que explodiram o número máximo de faltas. Mas isso não melhora a imagem da classe, até porque os próprios regimentos permitem o voto de liderança, onde o líder de um partido ou de bloco parlamentar, sozinho, vota em nome de toda a sua bancada. Para os registros oficiais, todos votaram, mas a maioria deles sequer compareceu à discussão e votação. Pela sua própria natureza, o parlamentar é o representante da comunidade na estrutura de poder. O senador representa seu estado, enquanto os deputados (federais e estaduais) e os vereadores representam diretamente o eleitor. Ao correrem o eleitorado pedindo votos, assumem compromissos de luta pelos interesses da comunidade. O mínimo que se espera é que compareçam às sessões e participem das discussões e votações. Quando não o fazem, perdem o prestígio junto ao eleitor. E, quando sua presença é fraudada, perdem muito mais. O regime presidencialista em que vivemos é, por natureza, executivista. Mas nem por isso, os parlamentares devem abrir mão de suas prerrogativas de interferir no rumo das decisões. Todos eles foram eleitos para levar sua contribuição ao aperfeiçoamento dos projetos e fiscalizar as ações do Executivo. Quando se ausentam ou deixam de cumprir com sua finalidade, o povo sente-se enganado e, com toda razão, passa a ver a classe com mais olhos. Quanto ao caso específico da Câmara Municipal de São Paulo, espera-se que a irregularidade seja apurada, os responsáveis punidos e, principalmente, a brecha seja eliminada. Tudo em nome da moral e dos bons costumes... Nota do Editor: Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo e dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo).
|