A sala de espera estava lotada. Mulheres e crianças dividiam o pequeno espaço. No ar uma mistura de suor, urina e desodorante barato. Uma enfermeira anunciou em um microfone antigo, o nome de Maria da Anunciação. Duas mulheres se dirigiram ao consultório. Mãe e filha. A primeira trazia no rosto preocupação. A segunda tinha um jeito abobalhado e medroso. O doutor ao notar o bucho avantajado da mais nova, pediu que essa fosse para trás do biombo, retirasse a roupa e se vestisse com a camisola do hospital. Enquanto isso, a mãe da dita cuja, nervosamente começou a falar da grande preocupação que a fez trazer para exame, a filha mais velha. A menina - disse ela - começou a vomitar de repente, a ter desmaios, a comer como louca, e de uns tempos para cá a crescer a barriga. Não pense o doutor que ela não recebeu cuidados, pois até o farmacêutico do bairro foi procurado! E sabe o que que ele disse depois de examinar a minha filha? Que aquilo estava parecendo diabetes! Passou inclusive vários remédios - alguns bem caros por sinal - e nada da menina sarar. Piorou. Gemia noite e dia. Sentado por trás da mesa, o médico ouvia e fingia anotar enquanto aguardava a paciente. Depois de mais ou menos quinze minutos a buchuda se aproximou. O doutor mandou que ela se deitasse na cama hospitalar e começou o exame. Apalpa daqui, cutuca acolá, mede e ausculta o barrigão. A paciente gemia enquanto sua mãe rezava baixinho. Ao término do detalhado exame, o médico falou para a paciente se trocar e voltar para conversarem. Desta vez a moça demorou pouco e logo estava sentada esperando o veredito. A pobre mãe não aguentando esperar mais nem um segundo, perguntou ao doutor se o caso da filha é grave, e ouviu a resposta: - Nem tanto, (respondeu ele) na verdade é um caso bem simples. - Vai precisar operar? (quis saber a mãe em desespero) Tenho pavor de cirurgia doutor. Meu marido morreu depois de ser operado. Com um sorriso o médico então soltou a bomba: - Talvez sejam necessários alguns cortes para trazer ao mundo seu neto, que pelo oque parece é bem graúdo! - Neto? (perguntou a mãe) Mas a minha filha não está doente? Ela está é prenha? Então todo esse mal estar era gravidez? Nesse momento começando a entender que a sua situação estava se complicando, a buchuda grita histericamente: - Grávida? Eu não sou nenhuma sem vergonha não! Eu sou moça honesta. Ninguém mexeu comigo não! - O doutor que tinha outros pacientes esperando, e que estava farto daquela sonsa, falou grosso: - Se você é sem vergonha ou não, não é o mais importante agora. O certo é que você está grávida e não vai demorar muito para que a criança nasça. Aconselho-te a parar com essa gemeção e começar logo os exames de pré-natal. Queira Deus que os remédios que você tomou não tenham feito mal ao feto. Agora com licença, preciso continuar as consultas. Lá fora há realmente doentes. Já na rua, a mãe (agora enfurecida) quis saber: - Quem é o pai dessa criança? Você vai ter que dizer. Vou ensinar ao canalha a não brincar com a honra de moça de família. A moça ainda veio com o lengalenga de que não era sem vergonha, que ninguém tinha mexido com ela, mas bastou receber da mãe um tabefe bem dado que falou num fio de voz: - Só se foi o Carlinhos. Ele é que ficava pegando em mim! Um mês depois ela pariu e o curioso é que o menino era claro e tinha olhos verdes. Ninguém entendeu nada, pois a garota e o tal Carlinhos eram negros.
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