Vivemos um momento de incerteza. O viajante não sabe quando chegará ao destino e nem o trabalhador é capaz de garantir o horário de entrada ao trabalho porque, no caminho, podem encontrar o bloqueio da operação-padrão da Polícia Rodoviária Federal, que fiscaliza o veículo minuciosamente apenas para demonstrar ao governo a sua insatisfação com os salários e as condições de trabalho. Os laboratórios de análises clínicas alertam sobre a baixa dos seus estoques de reagentes, que poderá obrigá-los a suspender exames e retardar procedimentos médicos. Seus insumos de trabalho encontram-se retidos em 150 navios fundeados na costa brasileira, que aguardam a liberação da Anvisa, cujos funcionários encontram-se em greve. Isso sem falar dos professores e servidores de diferentes órgãos, também parados em reivindicação salarial. A exemplo dos caminhoneiros de todo o país, os perueiros do Rio de Janeiro, agora também protestam e, com seu problema, levam o caos a toda a cidade. Esse estado grevista ou locautista traz prejuízos que podem ser contados em milhões de reais. E o mais perverso de todo o quadro é que quem paga a conta é a sociedade, através da frustração de produção, da perda de mercadorias que podem se deteriorar nos portos ou dos impostos já recolhidos que acabarão usados para tapar os rombos. O legislador que trabalhou na instituição do direito de greve ao trabalhador brasileiro buscava apenas o fortalecimento da parte mais frágil da relação trabalhista. Jamais deve ter imaginado que esse instrumento levaria ao impasse, ao travamento da atividade econômica e até à negação do sagrado direito de ir e vir. A greve, quando na iniciativa privada, logo é resolvida porque não há negócio que resista à inatividade e à cessação de renda prolongadas, e nem trabalhador grevista recalcitrante que ainda continue empregado. Infelizmente, não é o mesmo que ocorre quando o Estado é o patrão e, pela própria natureza, não é passível de falência e nem seus empregados são facilmente demissíveis. Por conta dessa especificidade, há o empurrar com a barriga por parte do governo empregador e a radicalização dos empregados, com nítidos prejuízos à sociedade que, passivamente, deixa de ter os serviços e ainda paga a conta da inadministração do conflito. Apesar do otimismo oficial em relação à economia, ninguém ignora que o mundo está em crise e o Brasil não é imune à tormenta. Da mesma forma que rapidamente pressionou a indústria automobilística para evitar demissões, o governo tem o dever de agir sem demora na condição de autoridade e de empregador para a solução do impasse com seus servidores, evitando que a falta dos serviços de sua responsabilidade possa ser um componente a mais no ameaçador quadro de crise. Apesar de terem nascido politicamente no seio das greves do ABC, os atuais integrantes do governo têm de considerar que hoje os tempos são outros e, por mais incômodo que isso possa lhes parecer, a responsabilidade de manter o país em funcionamento está sob seus ombros... Nota do Editor: Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo e dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo).
|