Essa coisa da magreza obrigatória está criando problemas nas cabeças afeitas aos modismos. As garotas dos desfiles - ideal de beleza de 99 entre 100 meninas - são invejadas e imitadas em vão. Come-se muito, é mais fácil ser gordo do que ter uma silhueta de sílfide. Por falar em gordos, há uma falácia criada por parte deles e que encontra eco em muitas cabeças. As pessoas se dizem gordas por culpa de disfunções hormonais, quem nunca ouviu uma pipa dizer: - Eu não como nada e engordo! Provavelmente não come nada entre a pizza das dez da manhã e o sundae de chocolate da sobremesa, exceto o almoço frugal, lasanha, lombo assado e batatas coradas. Zeca Gordo fazia jus ao apelido, pesava cento e oitenta quilos para um metro e setenta de altura. Era uma autêntica almôndega, seu prato preferido. A mãe, dona Lazinha, orgulhava-se do apetite do filho: - Dá gosto ver ele comer! Uma vez Zeca comeu as vinte e oito almôndegas que fariam parte do molho da macarronada para nove pessoas. Nesse dia seu João, o pai, pela primeira vez fez alusão aos hábitos pantagruélicos do filho: - Acho que esse menino está exagerando. Quando completou dezoito anos Zeca ganhou um carro de presente, um Chevrolet Impala SS, com câmbio no chão e bancos separados. Na primeira semana bateu de frente a mais de cem por hora. Foi para o hospital com a cara arrebentada. Os médicos tiveram de costurar os dentes com um fio de aço, o maxilar fraturado ficaria imobilizado por muito tempo. Zeca passou a alimentar-se apenas de líquidos; emagreceu trinta quilos em pouco mais de um mês. A medida em que o tempo passava, Zeca emagrecia a olhos vistos e entristecia no mesmo ritmo em que as banhas derretiam. Certo dia, não podendo mais suportar a fome, procurou seu amigo Zizo, que era um tanto abilolado, uma espécie de cientista maluco. Com a ajuda do "artista" retirou o arame dos dentes, que o impedia de comer. Depois foi ao Tim Tom, a lanchonete da moda onde pediu um xistudo duplo e uma vitamina de abacate para acompanhar. Na primeira mordida o maxilar travou após dar um estalo que foi notado por todos que estavam no recinto. Com os olhos arregalados e aterrorizado, Zeca foi levado mais uma vez para o hospital e submetido a uma cirurgia de emergência. Amarraram novamente os dentes. Sem alternativa, ele se conformou. Passou fome até que a fratura consolidasse, o que acabou lhe custando mais cinqüenta quilos. Quando recebeu alta pesava cem quilos, ainda era gordo, porém, distante da almôndega de outrora. A nova silhueta durou três meses, no quarto Zeca já havia engordado quarenta quilos. Depois disso nunca mais o vi, até que na semana passada um velhinho careca me cumprimentou sorridente. Depois de conversarmos um pouco acabei reconhecendo o Zeca Gordo, agora magrinho e enxuto. Ele fez uma cirurgia de redução de estomago e depois oito plásticas para retirar a pele que sobrou, segundo o próprio, suficiente para cobrir um circo. Pareceu-me satisfeito, é dele a frase: - Não havia gordos nos campos de concentração! É verdade, só é gordo quem come mais do que precisa, essa história de pôr a culpa no metabolismo é balela. Quando disserem que Buda comia apenas uma xícara de arroz por dia e era gordo daquele jeito, não acredite, é mentira, Buda morreu engasgado com carne de porco numa orgia gastronômica.
Nota do Editor: Sidney Borges é jornalista e trabalhou na Rede Globo, Rede Record, Folha de São Paulo, O Estado de São Paulo (Suplemento Marinha Mercante) Revista Voar, Revista Ícaro etc. Atualmente colabora com: O Guaruçá, Correio do Litoral, Observatório da Imprensa e Caros Amigos (sites); Lojas Murray, Sidney Borges e Ubatuba Víbora (blogs).
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