O jovem executivo entra nessa corrida de obstáculos e, como Usain Bolt, se prepara para grandes prêmios e medalhas de ouro pela vida. Seu trabalho é reconhecido - a recente promoção comprova isso - e a vida longa promete todo o brilho de estrela. Por isso trabalha de 13 a 14 horas por dia, mais de 90 horas por semana, almoça apressado, nem janta, come qualquer bobagem para enganar o estômago e segue em frente. Lembra-se de algum detalhe idiota no trânsito, faltou uma palavra naquele paper, pega o celular e liga para a empresa, nem se importa com o guarda e a multa; continua com a cabeça lá, no trabalho. No fim de semana, dá uma passada obrigatória no escritório para marcar presença com a chefia; afinal, nas noites de sábado e domingo é preciso abrir o notebook para arredondar as ideias daquele projeto. Férias? Nem pensar. Tem algum estresse, é fato, mas isso conta pontos a favor; afinal, a empresa gosta muito de executivos dedicados como ele. A mulher reclama, os filhos não vêem mais o pai. Mas a família há de entender a carreira, o sonho profissional, a realização. Além do mais, como viver com esse conforto sem o dinheiro da empresa, essa mina de ouro? Nosso jovem executivo, de tão apressado nessa corrida, nem percebeu: a fila andou, o tempo passou, e ele continua na sua batalha diária pela glória. Mas há outros jovens idealistas e loucos como ele empurrando-o para fora da companhia, na velha briga de foice pelos melhores postos e melhores salários. Os filhos cresceram, a mulher se distanciou, dos amigos nem se lembra mais. E, além do mais, é agora proprietário de uma formidável barriga e outro tanto de estresse, com todas as suas consequências físicas e psicológicas. No seu caso, o estresse virou sofrimento. Tons de grisalho nos cabelos, o caro executivo perdeu boa parte de sua passagem pela Terra consumindo glória, agora terá de recomeçar para recompor a mente e o corpo. Se é que o coração saiu ileso de tanta ganância ou ambição desmesurada. De todo modo, alguma coisa nosso personagem esqueceu pelo caminho: a vida. É importante saber que todo ser humano padece de estresse, que nos acompanha desde o nascimento. O problema é o exagero, essa carga de tensão que se acumula até provocar consequências desagradáveis. Como um infarto, por exemplo. Preste atenção a esses números: 315 mil pessoas morreram no País ano passado em virtude de doenças do coração. Esta é a segunda causa de óbito no País, atrás do acidente vascular cerebral. No mundo, os problemas cardiovasculares são responsáveis por quinze milhões de mortes anualmente. O maior pecado é o desleixo com a prevenção: ignorar os exames periódicos, como o de sangue e o eletrocardiograma, que permitem ao clínico avaliar os fatores de risco e o histórico de cada pessoa. Como um automóvel, o motor humano, depois de muita quilometragem, carece de prevenção e revisão. O coração tem inimigos mortais, como o colesterol alto, o sedentarismo e o tabagismo. Os dados são aterradores: de 11% a 20% da população adulta com mais de 20 anos sofrem de hipertensão arterial, problema presente entre 40% a 60% nas pessoas que desenvolvem um infarto do miocárdio. E os grandes vilões são estresse e ansiedade, fatores que prejudicam o sono e a alimentação, aumentando a adrenalina. Daí vem a hipertensão, carga a mais para sobrecarregar o coração. Ninguém pode esquecer que um sono de seis horas seguidas, todas as noites, é fundamental para a saúde. Do mesmo modo, o sedentarismo deve dar lugar às atividades físicas. Além de caminhadas, a participação em atividades culturais colabora para o controle emocional e harmoniza o pensamento. Um estudo norte-americano constatou algumas das principais causas de sofrimento no trabalho: pressão e responsabilidade, incapacidade de aceitar as próprias falhas, culpa pela desinformação, falta de tempo para a família, falta de apoio de pares ou superiores, frustração e falta de domínio sobre o futuro, falta de reconhecimento, tarefas estafantes, repetitivas e pesadas, medo de perder o emprego, obrigação de efetuar cortes, enxugamento ou redução de pessoal e, por fim, assédio moral. Nos Estados Unidos, os gastos das empresas com o estresse e suas consequência são estimados em 300 bilhões de dólares por ano. No Brasil ainda não se sabe. A gravidade do problema vem sendo comparada ao alcoolismo, à depressão, à dislexia ou à compulsão sexual, questões sobre as quais muitos executivos começam a falar mais abertamente. Atualmente, homens e mulheres de negócios são o principal alvo de estudos sobre estresse. As pessoas às vezes só percebem quando o corpo pede uma pausa - a produtividade cai ou a memória dá sinais de fadiga. A essa altura, já não dá mais para esconder que o estresse existe e que, de fato, é um problema. Portanto, passou da hora de pensar só no trabalho. Tudo o que não fez durante a escalada para subir a montanha, é preciso começar na hora de descer. Então, recomenda-se bom senso nessa hora: procurar o médico, fazer um check-up e, principalmente, dar valor à vida. Nota do Editor: Américo Tângari Jr. é médico cardiologista do Hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo.
|