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A temerária queda de braços que o governo argentino trava com o Grupo Clarín, maior conglomerado de comunicações do vizinho país, é um perigoso precedente para toda a América Latina. Além de usar seu rolo compressor para aprovar a Lei de Mídia, que fragmenta a holding de comunicação, a presidente Cristina Kirchner e seus seguidores pressionam juízes e confrontam a instituição judicial exigindo o cancelamento da liminar, mais uma vez revalidada nesta quinta-feira, que mantém a integridade do Clarín com percentuais de cobertura territorial e populacional de jornal, rádio e TV superiores ao teto de 35% estabelecido na legislação questionada. Não é a primeira vez que a Argentina comete violência contra grupos de comunicação. Em 1951, o caudilho Juan Domingo Perón expropriou o jornal “La Prensa” e em 1974, no seu terceiro e último mandato, interveio nos canais de TV. As ditaduras - muito comuns em todo o continente durante o século passado - amordaçaram a imprensa e perseguiram jornalistas sempre que estes as incomodavam. Mais recentemente, Hugo Chávez, na Venezuela, vem fazendo o mesmo. Agora, Cristina, na Argentina, o faz sob o argumento de defender a democracia. Não é prudente a nós, brasileiros, esquecer que, em 2009, quando a Argentina aprovava a lei que hoje ameaça o Clarín, o governo do presidente Lula preparava um projeto parecido para o Brasil, que só não vingou graças à reação da sociedade, notadamente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), que prometeu questionar sua constitucionalidade. A sociedade precisa manter-se vigilante, pois os ávidos mordacistas ainda ocupam as antessalas e os corredores dos palácios governamentais. Antigamente definida como “quarto poder”, por ocupar-se em fiscalizar os três poderes oficialmente constituídos (Executivo, Legislativo e Judiciário) e por atuar mais próxima do cidadão, a imprensa, sentinela, cumpre um importante papel. É através das páginas dos jornais e das informações veiculadas pela rádios, TVs e meios eletrônicos que a população se informa dos acontecimentos e, com esse conhecimento, toma suas posições. Lamentavelmente, autoridades e poderosos que se sentem incomodados ou ameaçados em seus negócios espúrios, não vacilam em insurgir contra o meio de comunicação. Fazem perseguições fiscais, boicote econômico e, sempre que podem, constrangem através do aporte de verbas públicas ou particulares que, mais do que o espaço adquirido, destinam-se a comprar a liberdade. Em vez de tolher, dificultar e perseguir, os governantes deveriam criar condições objetivas para a imprensa bem cumprir o sua missão. Desoneração tributária, acesso a linhas de crédito e importações e outras facilidades hoje concedidas a sindicatos, ongs e a diferentes segmentos ditos sociais, poderiam contribuir em muito para o fortalecimento dos veículos de comunicação e, consequentemente, da própria democracia. Não podemos ignorar que todos os grandes avanços vividos pela sociedade são impulsionados pela imprensa livre e cumpridora de suas finalidades. Os governantes têm de entender que até a atração de investimentos estrangeiros e a venda de nossos produtos ao exterior dependem da respeitabilidade e eficiência de nossos meios de comunicação. Tudo o que se fizer para atrapalhar esse trabalho, sem qualquer dúvida, será golpe contra os interesses do povo e da nação. Isso vale para o Brasil, Argentina, Venezuela e para a maior parte do mundo... Nota do Editor: Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo e dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo).
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