O incêndio que aconteceu na casa noturna na cidade de Santa Maria (RS) não devia causar estranheza, uma vez que, nos últimos seis meses houve, no mínimo, outros três incêndios de porte em São Paulo (lojas Americanas, loja na Rua São Caetano e, finalmente, o incêndio no depósito do Armarinhos Fernando), todos sem vítimas. No incêndio de Santa Maria foram 245 mortes e algumas pessoas hospitalizadas. Podemos então perguntar: por que temos estas ocorrências? Olhando o caso de Santa Maria. Em uma declaração foi dito que o plano de atuação de emergência estava vencido, porém que, a casa noturna possuía extintores e iluminação de emergência. Em outra declaração, falou-se dos seguranças da casa noturna, os quais, aparentemente, tinham obstruído as saídas, na expectativa de evitar que as pessoas saíssem sem pagar. Além disso, havia relato que a casa noturna contava com mais de 1.000 frequentadores (há relatos de que havia até 2.000 pessoas), mas o local só tinha capacidade para 500. Pensando sobre estes relatos, tenho algumas considerações. a) Quanto à lotação do local Pelo que foi citado nas declarações à imprensa, havia excesso de lotação no local, o que certamente complica qualquer plano de atuação de emergência. Porém, independente da quantidade de pessoas (500 se for a lotação esperada, 1000 a 2000 se for a lotação efetiva), é normal se esperar que haja tumulto na existência de qualquer anormalidade no local. Portanto, tumulto, corre-corre, medo etc. devem ser complicadores esperados. b) Quanto aos seguranças Os seguranças da casa noturna, via de regra, são treinados para conter brigas, controlar a entrada de pessoas e inibir que pessoas saiam sem pagar suas contas. Portanto, o foco principal de atuação destes profissionais está calcado no controle das pessoas e de suas ações não adequadas e não nos aspectos de correlacionados ao combate a princípio de incêndios e ao controle de sinistros e emergências, mesmo recebendo treinamento para tal. Como sabemos, controle da ação de pessoas em situações adversas de sinistro, é algo extremamente técnico e que, acredito, poucos profissionais têm. E desse grupo não faz parte seguranças da casas noturnas. c) Quanto aos equipamentos de segurança existentes Ainda segundo os relatos iniciais, a casa noturna disponha de extintores de incêndio e iluminação de emergência. Portanto, para o combate a incêndio, seja em seu princípio ou não, dispunha apenas de equipamentos onde há a necessidade de atuação do homem. Cabe uma reflexão, temos uma situação de emergência, um corre-corre de pessoas, o pânico está instalado, será que alguma pessoa, seja esta cliente da casa noturna, ou funcionário, consegue ter o controle emocional necessário para fazer o uso de algum equipamento manual? Creio que não. Assim sendo, pergunto: será que equipamentos manuais são adequados para o uso em casas noturnas e locais de grande aglutinação de pessoas? Uma opinião pessoal, os equipamentos manuais não são adequados e qualquer lugar de aglomeração de pessoas deveria contar com sistemas automáticos de combate a incêndios, como por exemplo: chuveiros automáticos (sprinklers), os quais independem da ação do homem. Quando se faz questionamentos como este, sempre o que ouço, é a afirmação de que: sempre atendemos a legislação. O que acredito ser verdade. Será que neste instante, não nos cabe algumas indagações: a) Se a legislação é atendida, será que está adequada ao risco? b) Se a legislação está adequada será que atendemos todos os requisitos? c) Será que os profissionais que fizeram o plano de energia da casa noturna, o fizeram baseado na legislação, que como sabemos obriga a requisitos mínimos, ou aos riscos existentes? d) Como será que se dava a fiscalização desta casa noturna? Sei que, até este momento pouco se sabe sobre o que de fato ocorreu e que será necessário uma perícia para a determinação das causas. O fato é que 245 vidas foram ceifadas. Meu questionamento é: o que vamos fazer para que situações como esta não mais ocorram. Sei que outros dirão que sistemas automáticos são caros. Posso dizer, como especialista que sistemas automáticos têm custo mais elevado que sistemas manuais, mas pergunto: será que o custo economizado vale a vida de 245 jovens com uma vida pela frente? Acredito que o fundamental a fazer é: não esquecermos este fato, estudá-lo profundamente e tomarmos ações para que fatos similares não ocorram, pois em caso de sinistros, podemos dizer que, estes ocorrem por falta de estudo e de um plano que envolva equipamentos manuais, automáticos, pessoal etc. bem elaborado e que seja adequado aos riscos existentes. Nota do Editor: Rogério Crotti é gerente executivo da Associação Brasileira de Sprinklers (ABSpk).
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