O torcedor corintiano de 17 anos apresenta-se à polícia paulista e diz ser o autor do disparo do sinalizador náutico que matou o jovem de 14 anos no estádio da Bolívia e provocou a prisão de 12 brasileiros no vizinho país. Se é verdade ou mentira, cabe as autoridades apurar. Mas do episódio resta clara a vulnerabilidade em que vivemos. O artefato - diz o rapaz - foi comprado na rua 25 de Março e, ao manuseá-lo, o comprador não tinha idéia do seu funcionamento. Tanto que, pelo dito, não sabia que uma parte iria se desprender da base e poderia atingir pessoas ou provocar outros danos. Os sinalizadores são peças importantes para a segurança náutica. Os ocupantes de uma embarcação com problemas o acionam como pedido de socorro que pode ser visto à distância. Mas, fora dessa finalidade, ou manuseados com imperícia, transformam-se numa arma letal, como se constatou no fatídico jogo Corinthians x San José. Sua venda e guarda deveriam ter o mesmo controle das munições, dos explosivos e outros produtos perigosos. Mas, como prova de um país desorganizado e omisso, esse material é encontrado em camelôs e, quando vencida sua validade, é vendido por importâncias irrisórias. O Brasil é pródigo em leis para o controle de armas, equipamentos, drogas, materiais radioativos e similares, mas muito negligente na fiscalização dessas mesmas leis. Tanto que em 1987 tivemos de amargar o acidente do Césio-137, ocorrido em Goiânia, onde catadores de recicláveis encontraram no lixo um aparelho abandonado por uma clínica que continha o produto, destruíram-no para aproveitar a parte metálica e contaminaram quase 300 pessoas que até hoje (as que não morreram) enfrentam graves problemas de saúde. Em janeiro tivemos o acidente da boate do Rio Grande do Sul, causado por um sinalizador utilizado irregularmente. E agora a morte do garoto boliviano, também por uso indevido do artefato. Precisamos deixar a passividade. Não existem razões sociais que possam justificar a livre comercialização de produtos que podem causar acidentes ou danos individuais ou coletivos. As autoridades que arrecadam tributos e autorizam o funcionamento do comércio, indústria e similares, têm a obrigação de fiscalizar os produtos que esses estabelecimentos colocam à disposição do público e reprimir tudo o que estiver em desacordo com as leis e as normas de segurança. Sinalizador, por exemplo, só devem vender as lojas de náutica, com o devido certificado de responsabilidade. Jamais o camelô. Pouco adianta termos um imenso cabedal de leis se elas não são traduzidas em realidade. Vejamos, pois o exemplo das armas, que foram retiradas do cidadão comum, mas não dos bandidos, hoje armados até os dentes por um mercado paralelo. Precisamos eliminar, definitivamente, com a cultura do desleixo e do jeitinho. Não podemos mais continuar a mercê de estruturas que podem explodir sob nossos pés ou cair sobre nossas cabeças. Isso é claro indicativo de subdesenvolvimento... Nota do Editor: Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo e dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo).
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