Não basta apenas a um escritor (ou pretenso) ler livro após livro, embeber a idéia dos outros e depois reproduzi-la com as suas palavras. Até aí nada de original. É necessário que um autor seja dono dos próprios pensamentos, das próprias idéias, servindo a dos outros de ilustração. Observa-se muito em quem escreve o fato de citar autores e, entre aspas, o que produziram. Tudo bem, possam esses discursos servir de modelo, de ponto de partida! Um bom escritor, no entanto, deve ter a sua escrita pautada no que pensa e reflete sobre a vida, o mundo, manifestando-se de forma criativa. Fernando Pessoa, por exemplo, em muitos poemas aparentemente simples, conseguiu infiltrar uma filosofia profunda, abrindo espaço à reflexão do interlocutor. A leitura é, sem dúvida, de grande importância, porém não encontrada apenas nos livros. A própria vida é uma leitura, necessário se faz a sua interpretação. No mundo, tudo tem voz, é uma comunicação, restando ao escritor desenvolver a sua acuidade observacional, advindo em seguida um registro criativo do que observou, ingressando no mundo ficcional ou reflexivo, ou seja, dos ficcionistas ou filósofos. Só vive realmente quem pode repassar um pouco de si a outros viventes, quando muitos deles só pensam em diversão, na aparência de mãos dadas com o hedonismo. Por outro lado, um bom autor literário não é o que diz tudo abertamente, mas o que leva à descoberta, através apenas da sugestão, ou seja, não afirma, porém sugere, assim desenvolvendo a imaginação, o poder de penetração dos leitores nas idéias do texto, tentando traduzi-lo de acordo com a sua agudez de percepção, o seu repertório e sensibilidade. Supomos que assim agiu o Criador: pôs tudo sabiamente no mundo, mas deixando aos humanos a sublime tarefa da decodificação, e imprimindo nessa, a marca profunda da sua originalidade. Assim também deve fazer o escritor: pôr tudo o que pensa e sente no papel, mas abrindo espaço para que o leitor recrie e reflita sobre os seus pronunciamentos.
|