19/08/2025  17h28
· Guia 2025     · O Guaruçá     · Cartões-postais     · Webmail     · Ubatuba            · · ·
O Guaruçá - Informação e Cultura
O GUARUÇÁ Índice d'O Guaruçá Colunistas SEÇÕES SERVIÇOS Biorritmo Busca n'O Guaruçá Expediente Home d'O Guaruçá
Acesso ao Sistema
Login
Senha

« Cadastro Gratuito »
SEÇÃO
Crônicas
23/03/2013 - 16h01
Uma pequena guerra
Vany Grizante
 

Por que nós, seres humanos temos tanta fascinação por pezinhos? Pezinhos, patinhas, pegadas de dedinhos delicados... talvez porque tenhamos a sensação de que são estes mesmos pequenos adendos do corpo que um dia levarão seus donos para longe? Ou é a dimensão que nos enternece, filhotes que nos tocam a alma de bichos que somos, uma ligação perdida em meio a milênios de evolução durante a qual convivemos, filhotes e adultos, animais e humanos...

Vi as pegadas na cozinha. Patinhas minúsculas, graciosas, sobre minha pia. Enterneci-me com as marquinhas do bichinho mas a seguir enojei-me com seus dejetos. E o misto de carinho e repulsa me fez prever que experimentaria um tormento irracional, fora da minha capacidade de compreensão.

Bichinho, que pena que o destino nos uniu. Azar seu, azar meu. Queria que você nunca tivesse vindo, jamais tivesse entrado em minha toca. Agora é guerra, e na guerra nos aproximamos, eu mais perto de sua irracionalidade e ambos tentando lutar pela sobrevivência. Sei que é uma luta injusta – ainda que você me cause arrepios de pavor, com artimanhas próprias que eu desconheço, apenas meu cérebro é maior e mais pesado que seu corpo todo. Creio que tenho vantagens competitivas (as lojas estão lotadas de armadilhas e venenos apropriados), mesmo que você ganhe em número: são quinze da sua espécie para cada um da minha, nessa cidade de subterrâneos que você conhece infinitamente melhor que eu.

Mas agora é guerra, e na guerra vale tudo. Torno-me bicho protegendo minha prole, assim como você. Defendo meu território com unhas e dentes, paus e pedras, ratoeiras e substâncias mortais, com um ódio que nem sei de onde vem e que nem imaginava que possuía. Pelo contrário, amaldiçoo nosso encontro, pois vi as pegadas de suas patinhas delicadas e meu coração se encheu de ternura ancestral. E agora devo eliminá-lo...

A guerra, bichinho, é um parênteses na sofisticada evolução dos seres de minha espécie. Agora sou apenas um animal acuado lutando pela minha sobrevivência - exatamente como você.


Nota do Editor: Vany Grizante (vanygriz@gmail.com) é arquiteta e escritora em São Paulo, SP. Escreve no site "Recanto das Letras" desde 2007. Publicou o livro "Abelhas sem Teto e outras crônicas" pela Editora All Print e participou da coletânea "Universo paulistano vol. II" da Editora Andross, ambos em 2010. Sua tese de mestrado sobre ambiente de trabalho na indústria encontra-se disponível para download no site: www.teses.usp.br.
PUBLICIDADE
ÚLTIMAS PUBLICAÇÕES SOBRE "CRÔNICAS"Índice das publicações sobre "CRÔNICAS"
31/12/2022 - 07h23 Enfim, `Arteado´!
30/12/2022 - 05h37 É pracabá
29/12/2022 - 06h33 Onde nascem os meus monstros
28/12/2022 - 06h39 Um Natal adulto
27/12/2022 - 07h36 Holy Night
26/12/2022 - 07h44 A vitória da Argentina
· FALE CONOSCO · ANUNCIE AQUI · TERMOS DE USO ·
Copyright © 1998-2025, UbaWeb. Direitos Reservados.