A inflação dos últimos 12 meses, apurada através do Índice de Preço ao Consumidor Amplo (IPCA) foi de 6,59%, superior aos 6,5% previstos pelo governo. O comércio varejista sofreu sua primeira queda de vendas em dez anos. A inflação dos alimentos (que respondem com 50% do setor) foi de 13,9% e os combustíveis subiram 3,6% em fevereiro. Os veículos e os eletrodomésticos, que ainda gozam de desoneração fiscal, também venderam menos. A redução do preço da eletricidade, festejada pelo governo nos últimos meses, já se anula pelos reajustes tarifários. O mercado trabalha dentro de um cenário de dúvida, especialmente quanto à possibilidade de aumento na taxa de juros. O caminho da desoneração fiscal e indução do mercado, encontrado pelo governo para enfrentar a crise de 2008 que, na fala oficial, aqui chegaria apenas como “marolinha”, é discutível. A renúncia fiscal somada à facilitação do crédito tornou atrativos os preços dos veículos e eletrodomésticos, levou muitos brasileiros a adquiri-los sem deles necessitar e, muitas vezes, sem reunir condições para saldar a dívida contraída. Quando usado por tempo limitado, esse recurso pode até dar certo, pois mantém a atividade produtiva durante a tormenta. Mas, quando se pereniza, constitui-se num grande risco, pois as compras são executadas mediante crédito e sem garantias concretas de liquidez. Tradicionalmente a economia se consolida através da poupança que nos permite a aquisição dos bens e serviços que vamos consumir. A constituição dos mercados criou a poupança de aluguel, onde o poupador aplica seu dinheiro e o consumidor descapitalizado o toma para suprir suas necessidades mediante o pagamento de juros como compensação ao uso da poupança alheia. Esse esquema foi montado muito mais no interesse dos produtores de bens e serviços do que no dos consumidores. Tanto que os governos tiveram de intervir para evitar que o consumidor, parte mais fraca da relação, seja penalizado com juros e procedimentos leoninos. Verifica-se, no enfrentamento à crise, mais uma vez, o mercado direcionado à proteção da atividade econômico-produtiva. O consumidor é apenas o destino da ação e, cada dia mais endividado, perde o poder de novas compras. É nesse ponto que, se os formuladores da política econômica não encontrarem outras alternativas – e parece não terem encontrado, pois as desonerações fiscais vão se prorrogando – aquilo que se tratou como marolinha poderá revelar-se no temeroso “tsunami” que já varreu os EUA, Japão e outros centros econômicos importantes do planeta. Precisamos de um efetivo combate aos efeitos da crise econômica internacional. Não basta empurrá-la para o futuro, quando sua força poderá ser ainda maior. Também não podemos negligenciar com a inflação. Toda a política econômica das últimas duas décadas está calcada na estabilidade dos preços. Se os preços voltarem a caminhar em galope, todo o esforço terá sido em vão e o futuro incerto. Acautelem-se senhoras e senhores do poder... Nota do Editor: Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo e dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo).
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