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Opinião
11/05/2013 - 13h02
Estupro e impunidade
Amadeu Roberto Garrido de Paula
 

Com uma arma na boca e depois de levar várias coronhadas, uma mulher de trinta anos é estuprada no interior de um micrô-onibus que fazia a linha Bangu/Carioca, no Rio de Janeiro, à frente de todos os demais passageiros, que já tinham sido "aliviados" de seus pertences pelo delinquente. Estupro com violência real, lesões corporais e injúria real grave. A recomposição psicológica dessa pobre mulher ao longo da vida talvez não seja obtida pela intervenção dos melhores analistas, psicólogos, psiquiatras, tranquilizantes e antidepressivos.

No entanto, se preso, o ensandecido facínora, que dava a impressão de drogado, estará reintegrado à sociedade, em condições psicológicas bem melhores do que a de sua pobre vítima, em tempo curtíssimo em vista da gravidade do fato. É certo que a cultura jurídica dos povos já soterrou majoritariamente a famosa lei do talião - olho por olho, dente por dente - mas o direito penal de todo o mundo é pacífico no sentido de que a punição deve guardar proporcionalidade entre a lesão causada à vítima e a pena que deve ser cumprida pelo infrator.

Enquanto a sociedade, em maioria expressiva, quase que unânime, pretende a redução da maioridade penal, sem refletir sobre a quantidade de armas de fogo disseminadas por todos os becos da sociedade brasileira e que rendem lucros astronômicos a seus fabricantes, esquecem-se de uma decisão, com a devida vênia, insustentável, do Supremo Tribunal Federal, proferida em sessão de 23 de fevereiro de 2006, relatada pelo ministro Marco Aurélio, que declarou a inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei nº 8072/90, que dizia ser inaplicável o regime de progressão continuada no cumprimento de penas impostas pela prática de crimes hediondos. É dizer: depois de um não longo período segregado, o estuprador passa a regime semi-aberto e depois aberto, provavelmente para violentar outras mulheres, auxiliado, agora, pela tecnologia em que se aperfeiçoou no cárcere. A Suprema Corte jamais reviu esse precedente, que foi tomado como um verdadeiro "leading case": jurisprudência retrospectiva ou petrificada, que não compatibiliza os princípios da Constituição Federal com a atual realidade histórica. Essa postura coloca em crise a íntegra do direito constitucional.

Parece que, no ponto, os doutos Ministros do STF se esquecem da advertência de Konrad Hesse, constitucionalista alemão a quem, amiúde, recorrem na prolação de outros julgamentos: "Toda Constituição é Constituição no tempo"; a realidade social, a que são referidas suas normas, está submetida à mudança histórica e esta, em nenhum caso, deixa incólume o conteúdo da Constituição. Quando se desatende dita mudança, o conteúdo constitucional "fica petrificado" e a curto ou longo prazo não poderá cumprir suas funções". ("Temas Fundamentais de Direito Constitucional", p. 13.)

Já quando proferida a declaração de inconstitucionalidade, há 9 anos, parece-nos que não havia substrato histórico para decisão constitucional dessa natureza em nosso país. Neste momento, ataques monstruosos, do tipo relatado, vêm se sucedendo, no Rio de Janeiro e nada nos garante, como de hábito, que se espraie para outros estados federados. Há poucos dias uma turista americana foi simplesmente sucateada física e sexualmente numa van, por plúrimos agentes. E nessas condições promoveremos, sob luzes espetaculares, a copa do mundo e as olimpíadas.

Na transição do último ano, uma estudante de medicina de 23 anos foi estuprada, morta e jogada no asfalto por uma súcia de degenerados que ocupam um ônibus em Cingapura. No entanto, a sociedade indiana reagiu de modo tão contundente que foram suspensas as comemorações do ano novo. E o nosso povo e as nossas mulheres? Quosque tandem?

Independentemente de medidas policiais, que são imperiosas e urgentes, nossa Suprema Corte não pode deixar de rever sua jurisprudência, e repristinar a vigência do § 1º do art. 2º da Lei 8072/90, para não admitir a aplicação da progressividade no cumprimento da pena aos autores de estupro e manter o condenado no regime inicial fechado, por toda a duração da reprimenda, dada sua conduta marcada pela hediondez.


Nota do Editor: Amadeu Roberto Garrido de Paula é advogado.

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