Os avanços tecnológicos fizeram de um mundo imenso uma pequena aldeia do século 21. As casas do passado eram anexas, como se vê, ainda, de muitas cidades em nosso país; provavelmente, com dois objetivos: defender-se dos malfeitores e comunicar-se imediatamente pelas paredes. De todo modo, conviviam simultaneamente. O espaço dos grandes conglomerados urbanos esgarçou o tempo e favoreceu a dispersão da sociedade, o que favoreceu a dominação dos poderosos: Hoje, com o impulso digital, veio a revolução dos bichos. O imenso planeta passou a ser uma aldeia, em que o espaço ainda é real, mas o tempo deixou de ser um conjunto vagaroso de instantes. É um único instante. As praças do inconformismo de todos os cantos, do ocidente ao oriente, se unificam. A liderança é a instantaneidade das comunicações - sobretudo dos malfeitos cotidianos. Falta aos jovens comunicadores filosofia, pauta de proposições, objetivos claros. Brota, porém, a irresignação, uma espécie de inconsciente coletivo. E ele diz que as coisas correm mal. A Organização das Nações Unidas - ONU tem feito esse alerta, inutilmente, nos últimos tempos. Os governos e os políticos locais fazem ouvidos de mercadores. As massas urbanas começam a se manifestar. Aliás, já começaram a tempo pelo mundo afora. No Brasil estavam adormecidas, a ponto de sua inanidade criar espécie em analistas estrangeiros. Agora vieram à tona. Os pretextos variam, a exemplo de um aumento suportável nas tarifas de ônibus, por um povo que já suportou aumentos maiores, numa história crônica de austeridade - ou, como queiram, de sofrimento. Assim como, na Turquia, uma praça a ser transformada num shopping. No fundo, cada nação tem sua agonia e seus ganchos específicos. A questão, porém, é muito mais complexa. Coloca-se em jogo a efetividade da democracia, seu significado profundo e o sentido das liberdades públicas. No Brasil, eclodiu um profundo sentimento de desalento com um partido que prometia uma nova história. E que chegou a dizer que a começara do zero. O que se desfez foi a esperança. A corrupção ficou escancarada. E todos sabem que é generalizada no contexto de uma burocracia empedernida, em que nada funciona. A maioria das obras do PAC foi glosada pelo TCU e voltou à primeira estaca. Nunca tantas licitações foram anuladas e as obras paralisadas. Com certeza não por erros, mas por bandalheiras. É raro o dia em que os jornais não noticiam um mal feito. Como se não bastasse, todos percebem que a economia está sem rumo. A inflação bate às portas. E nosso crescimento é pífio, mesmo em comparação com outros países do continente. Para completar, um país violento, sem saneamento básico para metade de suas famílias, sem estradas decentes, caminhos tortuosos que provocam tragédias e desgastes humanos e econômicos; sem transporte coletivo minimamente digno, e cujo governo considera integrantes da classe média segmentos que, em países do primeiro mundo tangenciariam a linha da pobreza. A administração risonha se entrega ao "fair plair" dos eventos lúdicos. É certo que foram criados empregos: conjunturais, transitórios. Depois da alegria - ou da tristeza - ficaremos com os esqueletos e com os desempregados. Em tempo real, pelo indutor digital, tudo isso invade as inteligências racionais ou emocionais; e os convites para os legítimos protestos são acolhidos não só pelos jovens. Estes, obviamente, têm mais motivos sociais e temporais para a luta e mais energia. São os líderes - desorientados embora - do admirável novo mundo, que a classe política ainda não tomou consciência - perplexa - do nascimento. Nota do Editor: Dr. Amadeu Garrido de Paula é advogado.
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