O espetáculo é cansativo e delirante ao mesmo tempo. A peça toda que está em cartaz, já há longa data, neste mofado teatro chamado Brasil, chega a ser patética. Dum lado temos um personagem disforme, de olhar baixo, expressão oblíqua, que é feito de otário um dia sim e noutro também, principalmente quando ele imagina que está interpretando o tal sujeito histórico, ativo e crítico. Fala até pelos cotovelos, mas ninguém o ouve, nem mesmo ele. Do outro lado, temos o seu antagonista, ou quase isso. São as otoridades. Também são disformes e desprovidas de caráter. Apresentam-se na encenação muito bem asseados, com formosa aparência que encanta as almas mais desavisadas. Tem por esporte, gerar intrigas de bastidores e coisas do gênero nos mais variados tons. E também falam muito. Demais! Porém, todos fingem ouvi-los com muita deferência, inclusive eles. Num dado momento, os primeiros gritam palavras de ordem que, em geral, foram insufladas por agentes de influência dos segundos. Fazem aquele carnaval, com direito a carro de som e tudo em sua apresentação circense de cidadanite de ocasião. Nesta prelação coletiva, todos se esforçam em dar aquela impressão de que se importam, realmente, com os rumos da nação. O que não contam é que, a nação, para eles, não ultrapassa os limites de sua carteira. E a opereta continua! No ato subseqüente temos as humanitárias e abnegadas otoridades. Após o entoar dos clamores populares, eis que eles se apresentam para salvar a todos com suas emergenciais medidas. Estes, com seus olhares mimosos (olhares estes que se esquivam da mira de qualquer um que ouse ver o que há para além das janelas de suas almas), esforçam-se, e muito, como nunca se viu antes na história deste país, em dizer que eles pretendem ouvir, atenciosamente, todas as solicitações das ruas (e dos bueiros também). O enredo é o fingimento total e irrestrito. E os devaneios não ficam por menos. Nesta, eles são elevados à categoria de reforma política salvadora enquanto, por detrás das cortinas, no fundo das fétidas coxias, estão os senhores do espetáculo, dirigindo toda a tragédia bufa que toma conta de nosso país, onde todas as competências certificam a podridão; onde todos os temperamentos se dão bem em meio à devassidão. Quanto aos diálogos da peça, ninguém os lê, nem mesmo os (depre)cívicos artistas. Vai tudo de improviso e, mesmo assim, com tudo dentro do que fora previsto e escrito pelo roteirista. Roteiro este de fácil leitura e compreensão, mas que, para infelicidade inteira da nação e alegria geral do espetáculo, continua sendo desdenhado pelas marionetes que hoje estão a bailar no palco da arena política brasileira que, neste teatrinho chinfrim, são os pseudo-protagonistas.
Nota do Editor: Dartagnan da Silva Zanela é professor e ensaísta. Autor dos livros: Sofia Perennis, O Ponto Arquimédico, A Boa Luta, In Foro Conscientiae e Nas Mãos de Cronos - ensaios sociológicos; mantém o site Falsum committit, qui verum tacet.
|