"Só pagam impostos os que não têm com que pagá-los" - Sofocleto, em "Sinlogismos"
Nos tempos pétreos do governo Lula o Estado está cada vez mais rico e a sociedade ("nobreza, clero e povo") cada vez mais pobre. Querem evidências? Aqui vão algumas: a Receita Federal, sempre de olho na grana do contribuinte, informa com estampado riso de hiena que no mês de janeiro obteve uma arrecadação recorde de R$ 31,99 bilhões, um aumento na ordem de 27,76% em relação ao mês de janeiro de 2004. A Caixa Econômica, auspiciosa, anuncia lucro de 1,400 bilhão. O Banco do Brasil, por sua vez, cuja tradição é repassar o prejuízo para o bolso do contribuinte, prevê um lucro líquido de mais R$ 3 bilhões e a Petrobrás, encabeçando a lista, anunciava ano passado um lucro de R$ 17,700 bilhões. Agora mesmo, diante da ardilosa Medida Provisória 232, que aumenta de 32% para 40% a base de cálculo da "contribuição" social das pequenas empresas e dos prestadores de serviço, os burocratas do governo tomaram como hábito justificar que os novos índices percentuais não significam obrigatoriamente aumento da carga tributária, alegando, paralelamente, sem esconder certa dose de cínica ambigüidade, que os aumentos cobrados pelo governo são justos. Mas justos para quem? Só se for para o Palácio do Planalto, a cada temporada mais empenhado na expansão dos gastos públicos com a aquisição de comida e bebida para o consumo dos membros da corte e servidores. Não se trata aqui do que se arrola como "intriga da oposição". A simples conferência das despesas efetuadas pelo Planalto (e o Alvorada), repassadas pelo SIAFI - Sistema Integrado de Administração Financeira - e confirmadas pelo Diário Oficial da União, evidencia a dimensão da voracidade cortesã. Nela encontramos, por exemplo, a discriminação trimestral de compras como: 1) sete toneladas de açúcar, 2) duas toneladas e meia de arroz, 3) duas toneladas de café, 4) 400 latas de azeitonas, 5) 500 quilos de bombons, 6) 800 latas de castanha de caju, 7) seis mil barras de chocolate, 8) duas mil latas de cerveja, 9) 610 garrafas de vinho, 10) 50 garrafas de licor, 11) uma tonelada e meia de banana, 12) uma tonelada de caqui, 13) 2400 abacaxis, 14) 495 litros de suco de uva, 15) duas mil dúzias de ovos, outro tanto de ameixa etc. etc. etc. - coisa de causar inveja, pela quantidade e qualidade, a outro Luiz, igualmente soberano, o XVI, antes de ser guilhotinado na França do século 18. Os gastos com as despesas do gabinete presidencial no governo do ex-metalúrgico estão aumentando de modo assustador. Em 1995, no reinado de FHC, as despesas foram na ordem de R$ 38,4 milhões. Em 2003, já no reino ("republicano") de Lula, deu um salto para R$ 318, 6 milhões e, em 2004, transcendeu a casa do R$ 373 milhões, superando a média de R$ 1,5 milhão por dia. Para o ano de 2005, a previsão é que os gastos públicos palacianos dupliquem. Por um motivo elementar: o aumento previsto do número de servidores da corte. O governo FHC funcionava com 1,1 mil servidores (contra 420 da Era Collor). Com Lula ampliou-se para 3,3 mil o número de funcionários servindo diretamente ao gabinete presidencial, com a previsão da contratação (imposta pela Medida Provisória 231) de mais 3.339 mil servidores em 2005, todos com salários entre R$ 1.500 e R$ 5.000, sem falar, é claro, nas garantias trabalhistas e gratificações por hora extra, prática de rotina na corte (ao todo, os gastos com o funcionalismo público federal no País ultrapassam R$ 90 bilhões). Tudo isso e mais o uso crescente e indiscriminado do cartão de crédito, que garante ao privilegiado funcionário do planalto a mágica de efetuar gastos sem a discriminação do serviço ou da compra na fatura. Um verdadeiro milagre! No último ano do governo FHC, as compras com cartão de crédito somaram R$ 761,7 mil. No reinado de Lula elas pularam para mais de R$ 3,8 milhões, ultrapassado a faixa dos R$ 5 milhões em 2004. Na brincadeira, os gastos anuais do Planalto com cartão de crédito, ainda que não confirmados, podem ser estimados, para o ano de 2005, em R$ 100 milhões. Lembro aos leitores que no início da gestão Lula foram nomeados 19 mil funcionários para os cargos de confiança do governo, sendo preenchidos, a partir daí, gradativamente, mais 20 mil cargos (alguns ainda em processo de ocupação), a maioria deles preenchidos por "companheiros" do PT, que, curiosamente, são convidados a repassar entre 10% e 30% dos salários arrancados dos cofres da viúva (leia-se contribuinte) - o que garante ao partido oficial o privilégio de permanente prosperidade. Os burocratas da área econômica do governo afirmam que é impossível se fazer cortes nos gastos públicos sem que se atinjam os programas da "área social". O próprio Renan Calheiros, o veterano noviço recentemente empossado na presidência do Senado, ao que tudo indica sensível ao Planalto, passa vaselina na cabeça da mídia e fala que é necessário uma "via" que permita a revisão da Medida Provisória 232 (um ônus violento para o bolso do brasileiro) sem que se interfira nos programas assistenciais e nas despesas do governo. "Bull shit" - bosta de boi, como dizem os americanos, um "substitutivo" para o dito popular brasileiro "pimenta no... dos outros é refresco". O que o presidente do Senado devia entender é que o profissional liberal (ou o pequeno empresário) que ganha, em média, três mil reais, não conta de modo algum com as milionárias mordomias do Planalto, Alvorada e Granja do Torto, obrigando-se, na luta econômica diária, a resgatar algo em torno de 74 tipos distintos de tributos e, ainda por cima, pagar - com o suor do próprio rosto - aluguel, condomínio, alimentação, telefone, gás, água, luz, transporte, gasolina e até vinho, cerveja e castanha (que ninguém é de ferro) - coisa que no Palácio do Planalto ninguém paga. Ou não é assim? Nota do Editor: Ipojuca Pontes é cineasta, jornalista, escritor e ex-Secretário Nacional da Cultura.
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