"O governo não pode fazer os homens ricos, mas pode empobrecê-los". - Ludwig von Mises, em "Ação humana"
Já se tornou vício de linguagem, talvez um cacoete retórico e seguramente um lugar-comum: nas solenidades ou eventos em que discursa, Lula da Silva, o presidente, com a atrevida empáfia de quem acaba de descobrir a pólvora, desfecha invariavelmente a frase fulminante que faz do governo um contínuo espetáculo de marketing: "Pela primeira vezes neste País..." Trata-se, às vezes, da simples inauguração de um chafariz, ou da mera re-inauguração de obra inconclusa por força do desperdício de governos passados, mas, a despeito das disposições em contrário, logo ouve-se ou vê-se, nos atos públicos retransmitidos pelas emissoras de televisão e rádio, com a fatalidade trágica que marca o desfecho final de alguma ópera-bufa, o estribilho exclusivista (e jactancioso) que dali em diante fará parte do "calendário histórico" do governo que se compraz em mentir para si próprio e para a nação: "Pela primeira vez neste País..." ou "é o único governo que..." É trágico, porém verdadeiro. O Brasil tem um enigma intransponível à sua frente, que precisa ser decifrado com urgência, se possível antes de 2006: Luiz Inácio Lula da Silva. Seria ele, com sua alma de cortiça e conversa de caixeiro-viajante, um mero apregoador de promessas alvissareiras para um público de boa-fé, vale dizer, um impostor? Um impenitente charlatão? O próprio Lula da Silva, diante do deliqüescente governo da Nova República, nos hiper-inflacionários anos 80, acusou o presidente Zé Sarney de ser um impostor. O então líder sindical, ao considerar sob a luz da visão de luta de classe o "empurra com a barriga" do Ribamar, exprimia um sentimento de calculada revolta que até certo ponto batia com a realidade circundante, toda ela absurda e avassaladora. E hoje? Hoje a situação não é muito diferente. De fato, com o aumento sistemático da carga tributária (em torno de 40%) substituindo o imposto inflacionário (e não legislado) da Nova República (3% ao dia), o governo populista de Lula, amparado em forte carga publicitária (tramada pelo contraventor Duda Mendonça), começa a fazer água. Os próprios aliados (os mais radicais) partem para a retaliação aberta dos que se julgam traídos. Sim, é verdade, todos têm razão, trata-se de uma retaliação azeitada no mais puro catecismo revolucionário (igualitário e terrorista) do marxismo-leninismo, sem nenhum valor tópico ou econômico - mas, ainda assim, fruto da indignação enraizada num passado partidário comum (ainda recente) comprometido com a "transformação radical" da sociedade brasileira. Eles, os revolucionários nutridos nos bem aquinhoados empregos públicos e nas cátedras universitárias, confrontam hoje com palavras de ordem os programas sociais "reformistas" (falidos) adaptados de outros governos, tipo "Fome Zero", "Primeiro Emprego", "Bolsa Família", meramente assistenciais que, para os aliados de ontem, não passam de paliativos "inúteis e demagógicos". A ira dos radicais para com o governo Lula é tanta, que só faz confirmar o velho chavão: quem tem amigos assim, não precisa de inimigos. Por outro lado - e a direita? Sim, a direita, como se comporta? A direita, segundo dizem, é malandra. Sabe que o governo é beneficiário de uma economia internacional de mercado cada vez mais ativa e que Lula segue sabiamente o receituário "neoliberal" do FMI. O "schisma" se dá no plano da voracidade fiscal em que o governo, a pretexto de cumprir os "programas sociais" populistas (eleitoreiros), toma, com medidas provisórias tipo 232, o dinheiro de investimento das empresas, o que significa, na prática, ampliação do desemprego e o esvaziamento do corroído bolso da sociedade. Neste aspecto, os índices macroeconômicos são claros e traduzem a seguinte aberração: enquanto o PIB (Produto Interno Bruto) cresce, a renda do trabalhador cai e o Estado - o velho Estado patrimonialista - cresce e se faz a cada dia mais forte. Com efeito, diante do arrocho fiscal, toda a sociedade protesta: sindicalistas, empresários, associações de classe, profissionais liberais, trabalhadores em geral se insurgem contra o mecanismo pilantra e oficial de sacar, via aumento dos impostos, o ganho do contribuinte. Fala-se já, abertamente, caso o Congresso insensível torne legal a famigerada MP 232, na emergência da desobediência civil, a necessária e eficaz insubordinação que mobiliza a sociedade em face da impertinência dos governos. Mas Lula da Silva, por sua vez, cultivado na crença e nos desvãos do sindicalismo que vê o Estado apenas como instrumento de classe, não desconfia que talvez o governo mais proveitoso seja exatamente aquele que menos aparece e - conforme ensina Tocqueville - habitua os governados a dele não precisar. Como é filho dileto do pior tipo de intervencionismo centralizador, o socialista estatizante, o ex-metalúrgico (e mentores) só acredita em aparelhamento do Estado, mais leis e regulamentações, impostos pesados e planejamento governamental. Como ambiciona fazer tudo e meter o dedo em tudo, o ex-sindicalista termina não fazendo nada - ou apenas alicerçando o fomento da corrupção oficial, da politicalha, do protecionismo corporativista parasitário, em suma, todo o conjunto de mazelas que cresce diante dos nossos olhos fatigados: o "Estado forte". De minha parte, concordo plenamente que um sujeito sem nenhum tipo de curso superior, desde que impregnado de certa dose de modéstia, bom senso e coragem possa cuidar de um grupo, empresa e até de um País. Mesmo no Brasil já nos deparamos com casos assim. Mas agora, mais do que nunca, é preciso ir devagar com o andor, pois o santo é de barro e a onagra claudica. A esta altura do campeonato não dá mais para descobrir a pólvora e impostar o papel de Lula, Primeiro e Único, principalmente quando se sabe que a sociedade - eis a Luz - resolve melhor.
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