Quando pensamos já ter visto todos os tipos de esquisitices, acaba surgindo uma nova. Depois de emplacado o sistema de cotas nas universidades, sob o argumento de oportunizar o acesso a uma faixa populacional com menores condições, surge agora e – pasmem – foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que reserva de um quinto até a metade das vagas na Câmara Federal e nas Assembléias Estaduais a candidatos que se declarem afrodescendentes. Se aprovada, a matéria criará, na prática, uma eleição paralela, e as casas legislativas serão “picadas” entre parlamentares afro e não afro. Estabelecer-se-ia, queiram ou não, o “apartheid” político, algo atentatório aos princípios da Lei Áurea ou, dependendo das circunstâncias, até a sua inversão. Em se tratando de oportunizar o ensino e o acesso dos segmentos menos favorecidos à educação e emancipação profissional e econômica, as cotas na universidade, apesar de todas as contradições e da possibilidade de produzir formandos de categoria diferente dos demais, ainda podem ser compreendidas e até aceitas. Mas, estabelecer a reserva de cadeiras a quem quer que seja na constituição do parlamento é uma grave lesão à democracia e à igualdade dos cidadãos. Ninguém deve ser privilegiado e nem penalizado por ter nascido rico, pobre, branco, negro, amarelo ou portador de qualquer conformidade ou inconformidade. A Constituição, no caput do artigo 5º, reza que “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”, e assim deve ser. Qualquer individuo que se propõe a candidatar-se a deputado não pode ser encarado como um desvalido carente de proteção extra. Pelo contrário, ele deve ser submetido ao mesmo processo que os demais, sem choro nem vela. Se criar a reserva de cadeiras parlamentares para os afro, o parlamento logo poderá ser instado a também estabelecer fatias para deficientes físicos, índios, sem terra, analfabetos, homossexuais, prostitutas etc. Oxalá os deputados das outras comissões e senadores que ainda analisarão essa PEC, tenham mais juízo que os seus pares integrantes da CCJ, e mandem a matéria direto para o arquivo. Todo negro que pretenda seguir carreira política é bem-vindo, mas deve entrar pela porta da frente, como já fizeram aqueles que hoje exercem mandatos e os que, na história e na atualidade, venceram os obstáculos e se destacam na vida nacional... Nota do Editor: Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo e dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo).
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