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Opinião
03/11/2013 - 17h04
Questões de privacidade na Internet e soberania
Catarina F. Pérez Alves e José N. Bádue Freire
 
A relação Brasil e EUA

Enquanto a presidente Dilma Rousseff discursa na Organização das Nações Unidas (ONU) sobre o atentado à soberania nacional perpetrado pelo setor de inteligência norte-americano, que obscuramente teria invadido suas contas de e-mail e acessado informações de cunho pessoal, no Brasil, a ministra Laurita Vaz, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), profere acórdão que obriga a empresa Google Brasil a fornecer dados de algumas contas de e-mail registradas no Gmail, mas que não estão sob o seu controle. A ministra determinou a quebra de tal sigilo para obter maiores esclarecimentos acerca de acusações de crimes como lavagem de dinheiro, tráfico de influência e advocacia administrativa.

A Google Brasil, por força disto, vive uma saia justa daquelas, pois não pode fornecer tais informações por determinações da lei norte-americana. O que ocorre é que todos os dados do Google são armazenados em servidores nos Estados Unidos. Apesar dos e-mails terem sido trocados entre brasileiros, o servidor que gerencia e armazena as informações nelas contidas se localiza nos EUA. É inegável, num caso como esse, que a lei americana e a soberania dos EUA também devem ser respeitadas para a obtenção de tais informações.

Para resolver situações como esta foi firmado, em 2001, um Tratado de Cooperação em Matéria Penal entre o Brasil e os Estados Unidos, estabelecendo, justamente, a forma de proceder nestes casos. Este tratado foi ratificado pelo Brasil, ou seja, fora plenamente aprovado pelo nosso Congresso Nacional e ganhou força de lei (Decreto n° 3810/2001).

Num caso como este, com o sistema implantado pelo tratado, nossas autoridades deveriam simplesmente requerer às norte-americanas as informações necessárias à investigação em curso no Brasil. Com o pedido feito, o setor responsável por este tipo de pedido nos EUA cuidaria dos trâmites internos e, caso não houvesse nenhum óbice legal à liberação das informações solicitadas, sem maiores delongas as encaminhariam às autoridades brasileiras. Simples assim. Pouca burocracia, poucos intermediários, maior celeridade.

Quando a ministra Laurita Vaz determina que a Google Brasil deve cumprir a ordem da autoridade judicial brasileira, ela: obriga a empresa fornecer algo do qual não detém o controle; força a Google Inc. a desobedecer às leis norte-americanas e; inutiliza um tratado que visa facilitar a troca de informações entre as autoridades de ambos os países.

A ministra alega que submeter o Judiciário a determinados trâmites diplomáticos afronta a “soberania nacional”. Ora, onde reside tal afronta quando o que se vislumbra é o mero cumprimento de um tratado internacional ratificado pelo Brasil, cujo fim é, justamente, facilitar o acesso às informações pelas autoridades de ambos os países, respeitando-se suas soberanias e seus ordenamentos jurídicos? Na verdade, é a nobre ministra que atenta contra a soberania americana neste acórdão, muito embora munida da melhor das intenções.

Se a autoridade brasileira tivesse o hábito de se utilizar dos meios dos quais dispõe, poderia conseguir estas informações pela via adequada, seguindo os requisitos definidos no artigo IV do Tratado. Qual a dificuldade das autoridades brasileiras se valerem dos mecanismos corretos, ao invés de optar por um caminho espinhoso e nada elegante como este? Não há dificuldade. Mas parece haver desconhecimento.

Será que decisões desta estirpe não podem colocar empresas multinacionais como a Google em situações bastante delicadas, por verem-se obrigadas a fazer, por ordem judicial de um país, aquilo que lhe é defeso pela lei de outro? Cabe lembrar que a Google não é a investigada, e sim a parceira, e sofre agora esta inversão de valores.

A decisão da ministra afronta não só o texto do Tratado, mas também um dispositivo essencial ao Direito Internacional, concretizado no art. 27 da Convenção de Viena Sobre o Direito dos Tratados, integralizada em nosso ordenamento jurídico pelo Decreto 7030/2009, que veda a qualquer país justificar o descumprimento de um acordo firmado e ratificado, baseando-se para isso, em disposições derivadas de seu direito interno.

Se o Brasil quer ser mais respeitado internacionalmente e seguir firme os objetivos que traçou nas últimas três décadas, um passo imprescindível é respeitar – e aplicar! – os tratados que assina. Só assim, inclusive, terá o respaldo suficiente para capitanear, na esfera multilateral, acordos que visem maior proteção às informações em âmbito virtual, como parece desejar a nossa presidente.


Nota do Editor: Catarina Fugulin Pérez Alves é advogada da área societária do Peixoto & Cury Advogados. E-mail: catarina.alves@peixotoecury.com.br. José Nantala Bádue Freire é advogado da área cível do Peixoto & Cury Advogados, pós-graduado em direito europeu pela Universidade de Coimbra e mestrando em direito internacional pela Universidade de São Paulo (USP). E-mail: josenantala.freire@peixotoecury.com.br.

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