Foi preciso a prisão de figurões para confirmar o que todos já sabem: os apenados brasileiros sofrem maus tratos nos estabelecimentos onde estão recolhidos, num verdadeiro atentado à dignidade da pessoa e aos direitos humanos. Deputados, senadores e outros políticos que circularam nos últimos dias pelo presídio da Papuda (Brasília) reclamam que Dirceu, Genoíno e outros condenados do mensalão foram submetidos ao banho frio. Também conseguiram remover Genoíno para tratar-se em prisão domiciliar e hospitalar e mobilizaram-se pelo regime semi-aberto a José Dirceu. Trabalho eficiente, pois os condenados só devem pagar a pena determinada pela Justiça e não sofrer revezes adicionais. Mas, os senhores parlamentares, não podem se esquecer que concomitantemente ao socorro dos mensaleiros, também precisam olhar se os demais recolhidos àquele presídio estão (ou não) sofrendo os mesmos constrangimentos e maus tratos. A partir do momento em que o sentenciado é recolhido, a sua segurança está entregue às mãos do Estado. É obrigação estatal colocá-lo num ambiente salubre, zelar pela sua saúde, dar condições para ressocialização e assisti-lo juridicamente. Mas é do conhecimento geral que o sistema prisional brasileiro está longe de cumprir adequadamente as suas finalidades. São freqüentes as denúncias de superlotação de celas e raios, falta de assistência à saúde e abandono jurídico, que levam muitos sentenciados sem recursos a permanecer encarcerados mesmo depois de cumprido os prazos legais para sua libertação. Essa falta de estrutura é uma das razões para o surgimento e fortalecimento das facções que hoje dominam os presídios, resolvem problemas dos detentos e seus familiares e os cooptam para continuar no crime, pois ficam devedores dos favores (ou investimentos) recebidos. Para serem verdadeiramente honestos, os senhores deputados e senadores que lutam pelos mensaleiros, são minimamente obrigados a voltar suas vistas para os milhares de outros presidiários recolhidos Brasil afora. Por questão de isonomia, os que tiverem doença grave merecem prisão hospitalar ou domiciliar, aos moldes da de Genoíno. Os que já cumpriram suas penas não podem continuar presos. E todos têm de receber tratamento adequado e oportunidade de ressocialização para a volta ao regular convívio social. Isso pode demandar investimentos, mas é obrigação do Estado que, para executar esse mutirão carcerário, se não tiver pessoal próprio, pode firmar parcerias público-privadas com entidades de classe, cursos superiores e órgãos sociais. O que não pode é dispensar o tratamento a que têm direito apenas aos figurões e ignorar os problemas da massa carcerária. Todos são brasileiros, portanto, detentores da mesma cidadania... Nota do Editor: Dirceu Cardoso Gonçalves é tenente da Polícia Militar do Estado de São Paulo e dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo).
|