Medicalização da vida de crianças e adolescentes é o título que resolvi dar a este artigo. Devo ressaltar que tal escolha se deve ao fato de ser este mesmo título dado a divulgação de um evento que aconteceu recentemente na UNICAMP e do qual tive a oportunidade e o prazer de participar e de levar alunos do Curso de Psicologia do Centro Universitário Anhanguera de Leme para prestigiá-lo. Escrever sobre a medicalização da vida de crianças e adolescentes para mim é de suma importância, uma vez que me permitirá compartilhar algumas das múltiplas problematizações e provocações que foram feitas durante o evento citado. Um tema polêmico e que gera diversas reflexões merece ser socializado, com o intuito de provocar tantas outras reflexões e quem sabe, inquietações. Entende-se por medicalização o processo que individualiza e transforma problemas de diferentes ordens, em problemas médicos, ou seja, em doenças. A sociedade brasileira vive este processo de maneira crescente em qualquer esfera da vida, e é desta forma que as questões políticas, sociais, culturais e afetivas que afligem a vida humana, são desconsideradas e transformadas em problemas, doenças de ordem individual. Este fenômeno de individualizar no corpo do individuo, aquilo que é da ordem do coletivo, esconde todos os demais fatores que deveriam ser considerados e envolvidos quando se analisa um fenômeno. É assim que, problemas políticos e sociais, são transformados em biológicos. Venho acompanhando há algum tempo as discussões sobre essa temática, por meio dos debates e produções acadêmicas veiculadas principalmente por psicólogos. No entanto, também acompanho as problematizações feitas pela médica pediatra Maria Aparecida Affonso Moyses sobre o assunto. Como professora Titular de Pediatria na Unicamp, Maria Aparecida, tem se debruçado a pesquisar as relações entre saúde, aprendizagem e desenvolvimento de crianças e adolescentes, tendo publicado livros e inúmeros artigos sobre o assunto. Dentre suas publicações, alguns apontamentos, entre eles, a intrigante constatação sobre o alto índice de crianças diagnosticadas com TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade), e sobre o aumento abusivo de crianças medicalizadas. De acordo com tal autora, o medicamento prescrito para tratar crianças hiperativas ou desatentas, é a Ritalina ou Concerta e sua droga psicoativa chama-se metilfenidato. O consumo deste medicamento aumentou exageradamente, uma vez que 70 mil caixas foram vendidas no ano 2000 e apenas nove anos depois este número saltou para 1.700.000 caixas prescritas! Estes índices absurdos colocam o Brasil como o segundo maior consumidor da droga, hoje também conhecida como: “a droga da obediência!” O assunto torna-se ainda mais assustador quando somos informados que aquela droga tem o mesmo mecanismo de ação que as anfetaminas e a cocaína, sendo que a única diferença está na intensidade. O medicamento pode provocar sérias reações adversas, tais como: cefaléia, insônia, sonolência, alucinações, suicídios e redução irreversível na estatura final, aumento do risco de drogadição, entre outros. Além disto, outra consideração importante que a autora faz, diz respeito às reações adversas mais comuns que acometem entre 40 a 50% dos consumidores. Dentre elas estão: o foco de atenção em uma única coisa de cada vez, ficar quieto, parado, contido em si mesmo, sendo que este efeito é nomeado em farmacologia de zumbilike. O ponto de destaque é que estas reações adversas têm sido apresentadas como efeito terapêutico! É inadmissível, chocante e desesperador entrar em contato com esta realidade: crianças estão sendo indevidamente medicadas, uma vez que não há evidencias científicas que comprovem que o medicamento produz resultados favoráveis e apesar disso, seu consumo tem sido exagerado! Esta realidade absurda, que indigna e intriga, provocou a criação do Fórum sobre Medicalização da Educação e da Sociedade, cujo propósito é articular profissionais, estudantes e sociedade em geral, para a mobilização, enfrentamento e superação do fenômeno da medicalização. Convido aos interessados a conhecer este fórum por meio do site www.medicalizacao.com.br. Neste portal há muito vídeos, entrevistas, leituras, documentos, entre outros materiais interessantes para consulta, pesquisa e informação! Aproveitem! Participem dessa luta contra a medicalização da vida! Nota do Editor: Professora Eloisa Hilsdorf Rocha Gimenez - Psicóloga (CRP- 61306-6), Doutora em Educação (UNICAMP) e Coordenadora do Curso de Psicologia do Centro Universitário Anhanguera de Leme.
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