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Opinião
07/01/2014 - 12h00
Sobre bichos e gente: as rinhas de ontem e de hoje
Hugo Albuquerque
 

No último dia 29 de dezembro, no que seria mais uma calma madrugada do interregno entre Natal e Ano Novo, milhares de brasileiros lotavam um ginásio em Las Vegas, enquanto outros milhões acompanhavam a luta do Brasil, não raro se espremendo em bares para ficar em frente ao aparelho de TV. O motivo? A revanche de Anderson Silva contra o norte-americano Chris Weidman, combate que marcava a disputa do cinturão mundial dos pesos médios do UFC, o maior espetáculo global de artes marciais. Em suma, entre os bons sentimentos natalinos e os votos de feliz ano novo, nossa população trocou chuteiras por luvas e o ímpeto por fazer gols pelo gosto de sangue.

Da luta mesmo não há muito o que falar. Primeiro round com vantagem para o norte-americano; segundo round com direito a uma bizarrice: após tentar acertar Weidman com um chute, Silva viu sua canela parar no joelho do adversário, o que resultou em uma dolorosa e grave fratura. Depois, seguiu-se uma festa prosaica, na qual Weidman comemorava, enquanto Silva, literalmente, urrava de dor aos seus pés. Convenhamos, trata-se de uma experiência antropológica única, que diz mais sobre o Brasil de hoje do que gostaríamos de admitir.

Ironia das ironias, há mais de cinquenta anos, o então presidente Jânio Quadros, em seu breve e agitado governo, efetivou a proibição das rinhas de galo no Brasil. Volta e meia, tentativas de fazê-las voltar à legalidade são impedidas de variadas maneiras pelo País, seja pela atuação política ou judicial de grupos de defesa dos animais. Ainda, dentre os gestos mais espetaculares de 2013, tivemos o cinematográfico resgate dos cachorros da raça beagle do Instituto Royal, onde eles seriam utilizados para pesquisas científicas.

Felizmente, o Brasil é um país onde não se tolera violência contra os animais. Seja dentro da legalidade ou mesmo fora dela. Porém, infelizmente, as coisas talvez sejam assim pelos motivos errados. Não nos consternamos com a violência; apenas a condenamos seletivamente: aqui, quando ela se volta contra seres nos quais nos projetamos, mas que são inocentes demais para questionarem nossa existência egocêntrica.

Não defendemos animalzinho nenhum, só o nosso próprio ego: queremos a vida animal no seu “modo pet” ou “modo zoológico” para nos servir. E nem me falem em defesa da natureza: fazemos ouvidos moucos o tempo todo para o sistema econômico, que destrói o meio ambiente. Apenas estamos preocupados com nós mesmos no sentido mais mesquinho e imediato.

Sem hipocrisia, quantos de nós seriam realmente contra pesquisas científicas com seres humanos em vez de beagles? Talvez o mesmo número que defende a proibição de rinhas de galo e as estigmatiza, mas que, ao mesmo tempo, vê nas rinhas de galo humanas dos octógonos do UFC algo normal. E não é o caso de dizer que os lutadores têm escolha e os animais não, mas sim que nós brasileiros fizemos uma opção clara: somos agora uma sociedade violentíssima, que só é contra a covardia quando nos sentimos individualmente culpados, pessoalmente ameaçados ou vemos que isso é inútil.

A questão não é diferenciar o que é animal do que é humano ou achar que todos somos animais e, portanto, sacrificáveis. A meu ver, seria o caso de saber que somos todos parte de um mesmo meio ambiente. Seria pertinente e educativo entender que, atrás do voyeurismo cada vez mais sádico da indústria do entretenimento e da tolerância seletiva com a violência, existe uma ditadura perversa do nosso individualismo – a qual tão logo poderá nos eliminar mesmo como indivíduos.


Nota do Editor: Hugo Albuquerque é mestrando em Direito Constitucional pela PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo).

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