Se bandido costuma ler jornal, imagino que sua sessão de humor não seja a mesma dos demais leitores, pois, ao invés das charges e tirinhas, deve ser as páginas políticas e policiais. Ele mata, rouba, estupra e, de quebra, ali encontra políticos e juristas interpretando suas ações como simples conseqüência dos problemas sociais brasileiros. Ele é maldoso, egoísta e arrogante, mas ali reduzem a explicação do crime à sua pobreza material. Diante de poéticas teorias, deve dar longas gargalhadas, saboreando-se em sua doce impunidade. A injustiça social brasileira, por óbvia evidência fática, tem influência direta sobre a criminalidade: a maioria dos criminosos procedem das baixas camadas sociais. Contudo, tal dado não pode ser avaliado isoladamente, sob pena de transformar-se em mote para um discurso que quase beira o incentivo à delinqüência. É imperativo perceber que, se alguns pobres são criminosos, a imensa maioria deles não o são. Disso resulta um silogismo lógico, que tal discurso tenta embaralhar: se a maioria dos criminosos são pobres, mas a maioria dos pobres não são criminosos, logo, apenas uma minoria dos pobres são criminosos. Ou, adiante: também apenas uma minoria de ricos o são. Desfeita a fumaça político-ideológica, a verdade vem à tona: ora, os pobres estão procurando emprego, lutando na vida, lavando roupa, limpando casa. Estão trabalhando, pagando suas contas e impostos. Estão buscando ajuda, participando da comunidade, indo na Igreja, educando seus filhos. Estão construindo um Brasil decente, vencendo um leão por dia, suando, subindo e descendo. Já os bandidos, maldosos, - pobres ou ricos - estão cometendo seus crimes e rindo à toa, impunes e glamorizados por essas teorias ilógicas e inconseqüentes. Esse descortinamento da verdade permite, no mínimo, três derivações conclusivas. Primeira: o Direito Penal não pode, a pretexto de relativizar a disparidade da pirâmide social brasileira, imiscuir-se em investigações sociológicas para aplicar a lei, pois estará transferindo a pena do criminoso, difusamente, para toda a sociedade e, em especial, para a imensa maioria dos pobres. É a outras áreas do conhecimento humano que cabe tal missão. Segunda: a pobreza, por si só, não explica a criminalidade, que tem causas muito mais vastas e complexas, alcançando questões como a desagregação familiar, a ausência de valores morais e a cultura da morte. E, terceira, a mais óbvia de todas: pobre não é bandido! Conclusão óbvia? Cuidado, estão tentando confundi-la. Nota do Editor: Cleber Benvegnú é advogado e escritor.
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